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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 550- 569, jan - fev. 2015

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maneira profunda o estatuto jurídico dos principais sujeitos processuais e

introduziu novas pautas na relação entre juiz, Ministério Público e acusa-

do, em um visível empenho em reequilibrar a desequilibrada relação de

poder que estava enraizada no sistema de justiça criminal no Brasil.

Em tempo algum, desde a aprovação e breve vigência do Código de

Processo Criminal do Império, em 1832, com sua feição liberal, logo aban-

donada (1841), o processo penal brasileiro fora desafiado a transformar-

-se de forma tão profunda, com novos estatutos jurídicos atinentes às

partes e ao juiz. Salvo pelas mudanças ocorridas em meados do século

XIX, tampouco o processo penal no Brasil havia passado por alterações

com capacidade de produzir efeitos em todos os graus e instâncias de

exercício da jurisdição penal – do juiz criminal singular, no mais isolado

município, ao Supremo Tribunal Federal, em uma autêntica proposta de

renovação de sua estrutura.

As esperadas mudanças no cotidiano das atividades do sistema de

justiça criminal, todavia, não ocorreram. Não se ignora o quanto é difícil e

raro mudar. Os educadores lembram sempre: “uma estrutura muito anti-

ga nos impõe a permanência de um modelo”

1

.

As transformações no campo da justiça criminal sofrem ainda por

interatuarem com as mudanças políticas em geral e estas, na América La-

tina dos anos 90, mesclaram o peso das decisões sobre a transição do

autoritarismo à democracia e a forte onda neoliberal.

Há reflexos disso nas políticas de encarceramento massivo, incri-

minação dos movimentos sociais e também na expansão das estratégias

de controle da criminalidade, adotadas no marco do chamado “processo

penal de emergência”, para todo tipo de casos penais, técnicas que são

fruto das experiências da denominada luta antimáfia, na Itália, e contra o

terrorismo e o tráfico de drogas, nos Estados Unidos da América.

Os reflexos processuais penais deste vínculo entre sistema político

e sistema de justiça criminal tornaram-se evidentes, durante o período

inicial da transição política (1985-88), com o recurso à manutenção da

base teórica de processo penal consolidada entre os anos 30 e 70 do sé-

culo XX, cuja consequência mais visível consistiu na acomodação das tra-

dições inquisitoriais no âmbito das novas experiências políticas democrá-

ticas e republicanas.

1 MOSÉ, Viviane.

A escola e os desafios contemporâneos.

Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013, p. 65.