

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 488 - 506, jan - fev. 2015
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em jogo entre os interlocutores serão debatidos e repensados por todos.
Assim, passa-se de uma
situação de comunicação à uma ética da discus-
são, onde a racionalidade que permanecia implícita e velada
na situação
de comunicação bem-sucedida torna-se
explícita
e se mostra à luz do dia
em seu caráter procedimental, evidenciando que as regras da comunica-
ção são aquilo sobre o quê os interlocutores se apoiam na expectativa de
busca do
consenso
e de resolução dos conflitos.
No entanto, no consenso ou reconciliação, a teoria de Habermas
– assim como a dialética hegeliana – vai ter que enfrentar aquilo mesmo
que entravava a unidade consensual, como o mal ou a negatividade que
impedia a positivação vai ter que ser enfrentado na reconciliação de He-
gel. O não reconhecimento comum da validade – diríamos, lógica – de um
argumento, tem de ser superado (
aufheben
) por uma ética que chegue ao
consenso, ou seja, que alcance finalmente o reconhecimento da validade
de uma visão de mundo em jogo na situação de discussão. Do ponto de
vista de uma ética da comunicação, no sentido oferecido a esse termo por
Jürgen Habermas, será exigência insuperável o paradigma comunicacional
da simetria de perspectivas alcançada no consenso. O consenso haber-
masiano repousa sobre a hipótese da simetria de perspectivas produzida
pela comunicação para defender uma filosofia que não se ancore sobre a
problemática do sujeito. Ora, esse transcendental alcançado pela comu-
nicação, essa espécie de reconciliação do espírito com aquilo que barrava
a unidade da experiência e que reconcilia as partes em litígio, ao mes-
mo tempo em que reivindica ser uma aposta não metafísica que dispensa
uma filosofia do sujeito, sustenta todo seu projeto em uma
antropologia
reconhecida e reivindicada por Habermas e seus comentadores.
Habermas enxerga a si mesmo como um sucessor e continuador de
Humboldt – que foi aquele que retomou a filosofia kantiana introduzindo
em sua estrutura a questão da linguagem -, e ao mesmo tempo, reivindi-
ca para si a continuidade do pensamento de Hegel e Marx, sendo aque-
les que introduziram o problema da emancipação (problema iluminista
e kantiano) no devir e no movimento da história. Pela via da linguagem,
Habermas quer reunir a tradição europeia de Humboldt com a filosofia da
linguagem (especialmente Austin e Searle). Do ponto de vista da história,
ele reivindica sua filiação ao humanismo iluminista, mas quer reconciliar
as críticas emancipatórias marxistas e hegelianas ao projeto moderno
(que ele compreende como projeto inacabado). Assim, o homem é um ser