

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 442 - 452, jan - fev. 2015
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O projeto político de militarização dos espaços urbanos – já em
vigor nas favelas do Rio –, de criminalização dos movimentos sociais e
de criminalização da desordem no espaço urbano mostra suas caras. Um
projeto gerido em nome do Estado Democrático de Direito. Da mesma
forma que o projeto político de ocupação militar das áreas de pobreza
tem como finalidade controlar e neutralizar os pobres – uma nítida ma-
nobra que busca garantir o aporte dos megainvestimentos -, o Estado,
assustado com uma nova possível desordem (agora) urbana, provocada
pelos protestos nas ruas da cidade, tratou de botar sua tropa – legislativo,
executivo e judiciário – em campo. Todos a serviço de uma ideia de ordem
pública considerada fundamental para o sucesso das cidades-empresas.
A voz das ruas
Várias foram as tentativas de entender o extraordinário fenômeno
que tomou conta do mundo nos últimos anos. Slavoj Zizek dá uma pista
do que parece ser a explicação certa. Para ele a mensagem básica dos ma-
nifestantes pelo mundo seria a de que foi rompido o tabu de que vivemos
no melhor mundo possível (com o capitalismo a todo vapor) e que, por
isso, teríamos a obrigação de pensar em alternativas, já que as do sécu-
lo XX não funcionaram
3
. Ainda sobre os manifestantes, Zizek afirma que
eles “não estão destruindo nada, estão reagindo ao modo como o sistema
gradualmente destrói a si próprio”.
4
Com acerto, afirma também que as
manifestações refletem o descontentamento geral com o sistema global
capitalista que assume suas particularidades em cada canto do mundo.
O filósofo esloveno vai mais fundo ao lamentar que jamais se questione
“a moldura institucional democrática do Estado de direito (burguês). Isso
continua sendo a vaca sagrada na qual mesmo as formas mais radicais
desse anticapitalismo ético (o fórum de Porto Alegre, o movimento de
Seattle) não se atrevem a tocar”
5
.
Por aqui encontramos também interessantes interpretações do fe-
nômeno. Ermínia Maricato afirma que quem conhece a realidade brasilei-
ra não estranhou as manifestações de junho de 2013. Segundo a professo-
ra da USP, as cidades são ignoradas por uma esquerda que não consegue
3 ZIZEK, Slavoj.
Occupy.
Movimentos de protesto que tomaram as ruas. São Paulo: Boitempo, 2012. p. 16.
4
Idem.
p. 17.
5
Idem
, p. 22.