

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 442 - 452, jan - fev. 2015
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tação de que as formas do capital, contemporâneas a Marx e por ele es-
tudadas, transformaram-se, e é preciso estudar sua nova composição de
classe com o método marxiano.
A partir desses fundamentos e em parceria com o jovem intelectu-
al norte-americano Michael Hardt, Negri escreveu, na década passada, a
trilogia
Império, Multidão, Comum
. Nela, Negri e Hardt refletem sobre
as novas formas de comando e exploração capitalista (bem como as no-
vas e correspondentes formas de subjetivação e resistência) que nos são
contemporâneas. Elas se caracterizam pela desterritorialização do poder
militar, das comunicações e dos fluxos produtivos e financeiros. Tais pro-
cessos põem em xeque as soberanias estatais, configurando uma nova e
planetária forma de poder, caracterizada como “sociedade global de con-
trole” a partir das pesquisas de Foucault e Deleuze.
Para Negri e Hardt, no capitalismo do nosso tempo o regime de fá-
brica perdeu sua centralidade e proeminência, com a consequente corro-
são das formas de organização política e social que lhe eram correlatas: o
Estado, o partido, o sindicato. Numa economia em que a importância e o
valor do
software
geralmente superam os do
hardware
, por exemplo, em
que os processos de valorização e acumulação dependem cada vez mais
de “externalidades” – como nível de educação, estruturas de transporte
e comunicação e outras condições “ambientais” –, a relação de capital se
traduz cada vez mais em formas de “biopoder”, que se exerce sobre a pró-
pria vida e todos os circuitos de cooperação, inclusive afetiva. E os explora
cada vez mais predatoriamente.
As metrópoles tornam-se as fábricas de nosso tempo, e a produ-
ção exige cada vez mais a ação autônoma dos trabalhadores, a partir de
fatores de produção como os circuitos de comunicação e informação, os
códigos e as linguagens. O “trabalho imaterial e afetivo”, que exige sem-
pre mais interação entre os trabalhadores em sua integralidade, valoriza-
-se comparativamente à produção “material”: atividades terapêuticas e
de cuidados físicos, psíquicos e estéticos, do psicanalista à
baby-sitter
, do
trabalho doméstico ao
personal trainer
, do médico à “esteticista”, da “ma-
lhação” ao entretenimento, do jornalismo à publicidade. Formas de vida e
trabalho criados pelos pobres valorizam territórios antes degradados, que
em seguida são expropriados pelos ricos nos processos de “gentrificação”,
fazendo com que os trabalhadores deles expulsos se desloquem para no-
vas áreas degradadas, valorizando-as, para de novo perdê-las.