

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 442 - 452, jan - fev. 2015
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do reconhecimento da multiplicidade dos modos de viver, sentir, resistir,
pensar e produzir; se tomamos o capital como relação violenta de coman-
do e exploração sobre os que trabalham – então podemos compreender
o que há em comum entre Antonio Negri e nós.
Exemplo extraordinário de intelectual e militante em cuja trajetória
reflexão e ação não se separam, “Toni” tem dedicado sua vida ao esforço
de participar das lutas pela liberação da potência afetiva, criativa e pro-
dutiva dos que vivem e trabalham. Iniciou sua militância na juventude,
por meio do trabalho pastoral desenvolvido pelos “padres-operários” do
Vêneto na década de 50 do século passado. Nos anos 60, participou do es-
forço de recuperar o legado de liberação do pensamento marxiano, após a
tragédia do “socialismo real” e os crimes do stalinismo, integrando-se no
campo do chamado “operaísmo” italiano e vivendo intensamente a expe-
riência da construção da rede de movimentos de insurgência conhecida
como Autonomia Operária.
Naquele contexto, Negri participou do esforço de compreensão das
transformações que o capitalismo começava a experimentar, e da conse-
quente busca de novas alternativas para a organização e a ação de uma
grande parcela da classe trabalhadora, que rejeitava o reformismo do
então poderoso Partido Comunista Italiano (PCI). É dessa época o con-
junto de ensaios reunidos no livro
La Forma-Stato
, em que se propôs a
fazer a “crítica da economia política da Constituição”. E recuperar a pers-
pectiva marxiana segundo a qual o Estado é, irremissivelmente, uma
forma do poder político que serve à opressão de classe. Daí a dolorosa
reflexão sobre a tragédia da Revolução Soviética e o paradoxal “salto
mortal” representado pela tentativa leninista de acelerar a extinção do
Estado por meio de seu fortalecimento.
Negri viveu intensamente, na teoria e na prática, entre a cátedra da
Universidade de Pádua e as mobilizações de porta de fábrica, o chamado
“1968 Italiano”, que começou bem antes e só terminou em 1977, com a
brutal reação armada que acumpliciou bandos fascistas e forças estatais.
Apontado, injusta e absurdamente, como “mentor” e partícipe das equi-
vocadas ações das Brigadas Vermelhas (grupo oriundo de uma dissidência
do PCI, cujos centralismo, vanguardismo e voluntarismo sempre criticara),
o
cattivo maestro
foi preso em 1978.
Acusado de implicação no sequestro e na execução de Aldo Moro,
ex-chefe de Governo e então presidente do Partido Democrata-Cristão,