

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 442 - 452, jan - fev. 2015
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Negri foi condenado com base exclusivamente em delações premiadas de
“brigadistas”, que o incriminaram para obter redução de pena, ao arrepio
das mais elementares garantias do devido processo legal. Face à injustiça
da condenação, o Partido Radical, de orientação social-liberal, inscreveu-o
em sua lista de candidatos ao Parlamento para que, eleito, pudesse obter
imunidade e ser libertado. Eleito e liberto, Negri partiu para o exílio em
Paris antes que o Parlamento cassasse sua imunidade. Retornou em 1997,
para cumprir a pena restante e reabrir a discussão sobre os presos polí-
ticos condenados com base nas leis de exceção editadas 20 anos antes.
No cárcere, Negri dedicou-se ao estudo da obra de Spinoza, para bus-
car ali os fundamentos para uma compreensão imanente da política, a fim
de “liberar Marx da dialética hegeliana” e suas sínteses autocráticas. O re-
sultado foi o polêmico livro “Anomalia Selvagem”, no qual recupera um “Spi-
noza subversivo” através da oposição entre a potência da multidão, sujeito
político imanente e múltiplo, e o poder soberano do Estado, caracterizado
pela transcendência e pela unidade, em busca de uma democracia absoluta
por meio da qual o comum pudesse se constituir a partir da multiplicidade.
Já em Paris, Negri estabeleceu fecundo diálogo com Gilles Deleuze
e Felix Guattari em torno de categorias já delineadas por Michel Foucault,
para pensar as novas formas de dominação e resistência na chamada
“pós-modernidade”. Desse esforço resultou o excelente
Poder Constituin-
te – ensaio sobre as alternativas da modernidade
(que tive a grata alegria
de traduzir para o português). Nele, Negri passa em revista cinco séculos
de revoluções e teorizações, dos tumultos da Renascença maquiaveliana
à Revolução de 1917, liderada por “Lênin, o ocidental”. No esforço de re-
fletir sobre as condições de superação do recorrente “Termidor” de que
têm padecido as grandes revoluções da era moderna, Negri reconstrói a
“linha alternativa e maldita” da modernidade, representada, no plano da
reflexão política, pelo eixo Maquiavel-Spinoza-Marx.
Em Maquiavel, Negri recupera o princípio constituinte do antago-
nismo tumultuário que opõe os “pequenos”, e seu desejo de liberação,
aos “grandes”, e seu desejo de opressão e predação. Reflete, assim, sobre
a produção das “instituições da liberdade” por meio das quais pode se via-
bilizar o “devir-príncipe” da multidão e a constituição de uma democracia
absoluta, sujeito e forma estes recuperados do pensamento spinozano.
Tudo isso no horizonte das transformações do capitalismo contemporâ-
neo, pensadas marxianamente “para além de Marx”, a partir da consta-