

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 419 - 434, jan - fev. 2015
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mente porque se basta a si mesma, não tem nome porque não quer, nem
pode, ter objeto de ordens. Não é sujeito histórico transcendente, é um
jeito comum. São todas as minorias, retalhadas juntas e fundidas como
uma nova liga, as mesas que a direita sempre apontou como incapazes,
destinadas à tutela do varão branco da Casa Grande, mas que a esquerda
só defendeu pelo viés da possibilidade de sua civilização; a própria expe-
riência que a defendeu como tal, que defendeu
o povão como a razão de
ser do Brasil
, é aquela que se quedou à ideia de que a Classe sem Nome
deveria, agora, ser batizada e educada para sentar à mesa da Casa Grande
– quando fosse convidada, por certo.
Não à toa, em um mundo no qual uma miríade de movimentos
identitários desafiam à ordem imperial global, no Brasil, o movimento não
tem nome. Seu sistema imunológico face as movimentações, ele mesmo
não tem rosto, nem bandeira: são os
black blocs
. A postura de condena-
ção, absolutamente medíocre, é explicada pelo fato de eles não terem
rosto. Como se alguém pudesse tê-lo sob repressão. Ou como se o proble-
ma fosse uma violência difusa causada pela
ação direta
, a mesma que o
próprio PT jamais condenou em movimentos como o MST. Não possuem
rosto, identidade, líderes, existência contínua, são incapturáveis enquan-
to tais. Com a Classe sem Nome, a ortodoxia policial talvez não ajude, mas
pipocam os conceitos – prescritivos, todos – dos cientistas régios: nova
classe média, classe C e por aí vai.
O ponto é que mesmo aquilo que possa ser capturado na forma
universal da classe média não encontrará, assim, sua passividade: por si-
nal, uma das novidades que as Jornadas de Junho trouxeram é que a clas-
se média chegou ao seu ponto de saturação. Sim, vândalos. Vândalos num
sentido extramoral, movidos todos por uma condição afetiva impossível.
O homem médio, de classe média, de gostos médios, escravo da
media
e
das médias escolares e profissionais de desempenho não aguenta mais
a sua vida.
Tornaram-se, pois, bárbaros!
A questão, mais do que a pró-
pria ascensão selvagem é a própria insuficiência do solvente universal que
imaginaram. Não é apenas que os jovens da periferia não aceitam mais o
destino de sujeição de seus pais e avós, mas que o próprio filho da classe
média não suporta a perspectiva de uma vida monótona, de festas, via-
gens e objetos vazios. A aritmética das pesquisas jamais entenderá esse
ritmo, como não entendeu nem anteviu, e não adianta falar no quadro em
que vivemos como um mero
soluço
.