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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 39 - 53, jan - fev. 2015

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O complexo de Édipo cumpre um papel primordial na estrutura do

sujeito e na configuração do desejo. Ao propiciar uma moldura discursiva

pela descrição do mito, Freud nos permite ampliar de sobremaneira a es-

cuta psicanalítica e das práticas político-sociais. Há algo de fundamental

que se presentifica no Édipo e que, neste contexto, precisa ser desvelado.

Comecemos do início, onde o pai é visto intervindo em vários planos.

Em primeiro lugar, o pai se coloca como aquele que interdita a mãe

e é neste ponto exato que a sua figura encontra-se historicamente vin-

culada à lei primordial da proibição do incesto.

7

Eis aqui o “

pai

terrível

”,

aquele que se encontra encarregado de trazer a interdição, interferindo

violentamente na relação fálica estabelecida entre a mãe e o filho. Em

poucas palavras, é isto que o pai proíbe: a mãe, objeto que lhe pertence e

que deve ser frustrado das mãos da criança.

8

“A intervenção do pai introduz aqui a ordem simbólica com suas

defesas, o reino da lei, a saber, que o assunto ao mesmo tempo sai das

mãos da criança e é resolvido alhures. O pai é aquele com quem não há

mais chance de ganhar, senão aceitando tal e qual a divisão das apostas. A

ordem simbólica intervém precisamente no plano imaginário. Não é à toa

que a castração incide sobre o falo imaginário, mas de certo modo fora do

par real. A ordem é assim restabelecida, e no seu interior a criança poderá

aguardar a evolução dos acontecimentos”.

9

A ideia de um pai “suficientemente mau”, como certa vez falou

Marco Antonio Coutinho Jorge

10

, é extremamente importante à consti-

tuição psíquica

11

. O pai não intervém à toa, mas sim para lembrar a todos

7 LACAN, Jacques.

O Seminário,

Livro 5

:

as formações do inconsciente. Rio de Janeiro: Zahar, 1999, p. 174.

8 A rigor, é como se o filho perguntasse: “o que quer essa mulher aí? Eu bem que gostaria que fosse a mim que ela

quer, mas está muito claro que não é só a mim que ela quer. Há outra coisa que mexe com ela – é o

x

, o significado. E

o significado das idas e vindas da mãe é o falo (...). A criança, com maior ou menor astúcia ou sorte, pode conseguir

vislumbrar desde muito cedo o que é o

x

imaginário e, uma vez tendo compreendido, fazer-se de falo. Mas a via

imaginária não é via normal”. LACAN, Jacques.

O Seminário

, Livro 5: as formações do inconsciente. Rio de Janeiro:

Zahar, 1999, p. 181.

9 LACAN, Jacques.

O Seminário,

Livro 4: relação de objeto. Rio de Janeiro: Zahar, 1995, p. 233.

10 Esta concepção, segundo Coutinho, pode ser depreendida como um reverso da “mãe suficientemente boa” de-

senvolvida por Melanie Klein. As ideias de Marco Antonio Coutinho Jorge a que se faz referência foram tangen-

cialmente indicadas no transcorrer da aula ministrada para o grupo de formação permanente do Corpo Freudiano

Escola de Psicanálise, no dia 22 de novembro de 2011.

11 Na mesma conferência do dia 22 de novembro de 2011, Coutinho Jorge teve a oportunidade de explicar que não

foi outro o ponto nodal dos problemas enfrentados pelo pequeno Hans, qual seja a ausência de um “pai suficien-

temente mau”. Em outras palavras, foi o que disse Lacan: “É com esta chave, e apenas com ela, que vocês podem

compreender o que está em jogo quando o pequeno Hans fomenta a sua fobia. O que caracteriza esta observação, e

penso poder demonstrá-lo a vocês, é que, apesar de todo o amor do pai, toda a sua gentileza, toda a sua inteligência

graças à qual temos a observação, não existe pai real”. LACAN, Jacques.

O Seminário,

Livro 4: relação de objeto. Rio

de Janeiro: Zahar, 1995, p. 216.