

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 39 - 53, jan - fev. 2015
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se faz presente ao inscrever a Lei, em qualquer de suas dimensões (psicana-
lítica ou jurídico-político). Certas observações clínicas, diria Coutinho Jorge
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,
expandem a compreensão analítica na direção da cultura e do laço social.
É disso que precisamos para pensar o autoritarismo estatal e a
servidão política à tirania, constantemente revivida na história, como já
havia se indignado Étienne de La Boétie por volta de 1550
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.
Entre as formas contemporâneas de exercício autoritário do poder
do Estado, há algo em comum: o pai não será morto jamais e terá o seu lu-
gar reivindicado incessantemente. Esta função será preenchida, o proble-
ma é conhecer quem fará o papel de operador e a que custo isto se dará.
Medoda castração e a chegada do Pai “suficientementemau”.
Começaremos nossa reflexão por Eugenio Raul Zaffaroni
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:
“(A lei do Pai não é o Código Penal). É central no pensamento
lacaniano a ideia do nome do pai, proveniente da lei do pai
de Freud, mediante a qual a pessoa entra na ordem simbó-
lica que ordena o mundo. Trata-se de uma função paterna
proibitiva. Embora eu não saiba muito sobre isso, entendo
que Lacan aprofunda o que provém de Freud, o que, passan-
do ao largo de toda a complexidade do tema, significa dizer,
em palavras simples, que a partir daí vai se aprendendo que
algumas coisas estão proibidas. Aqui também, com bastante
frequência ocorre o salto da lei do pai para o código penal.
Acho que os dois conceitos não têm nada a ver um com outro.
Ou a lei do pai é definida em um Parlamento? Ou por acaso
a proibição de sexo inter-racial nazista é parte da lei do pai?"
A conclusão do maior penalista latino-americano vivo é salutar, ire-
mos, porém, um pouco além no que se refere à figura do pai, enquanto
função, de fato, uma das pedras angulares da teoria psicanalítica. Se a cas-
tração é o signo do drama do Édipo como quer Lacan, será dele também
o seu pivô implícito.
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3 JORGE, Marco Antonio Coutinho.
Fundamentos da Psicanálise: De Freud a Lacan.
A clínica da fantasia. V. 2. Rio
de Janeiro: Zahar, 2010, p. 10.
4 LA BOÉTIE, Étienne de.
Discurso da Servidão Voluntária. (
trad. Casemiro Linarth). São Paulo: Martin Claret, 2009.
5 ZAFFARONI, Eugenio Raul.
A palavra dos mortos.
Conferências de criminologia cautelar. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 281.
6 LACAN, Jacques.
O Seminário,
Livro 4: relação de objeto. Rio de Janeiro: Zahar, 1995, p. 215.