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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 356 - 375, jan - fev. 2015

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fundamental para a compreensão da criminologia. Entretanto, nosso in-

teresse aqui não é fazer um novo

Histórias dos pensamentos criminoló-

gicos

21

. Evidentemente, a história das penas é repleta de

tragédias

, um

verdadeiro banho de sangue promovido pelo Estado e pela Igreja Católica.

Um número incalculável de vidas foi tirado, fazendo com que as guerras,

se comparadas ao direito penal, pareçam uma verdadeira piada. É exata-

mente por isso que é importante estudarmos a trágica história das penas

para compreendermos a

farsa

que é a legitimação do punitivismo. Essa

crítica, com base no pensamento marxiano, já demonstra a necessidade/

possibilidade de mudança; de transformação.

Tendo em vista que este artigo se pauta na contribuição de Marx

e Engels para a crítica do direito e, em especial, o recorte que demos dá es-

pecificidade ao direito penal, trataremos aqui da

criminologia crítica

. Com

brilhantismo, Eric nos mostra que

A era do Capital

– período entre 1789 a

1848 – é o período de consolidação da burguesia no poder; a consolidação da

moderna dominação de classe. Tal era foi marcada por uma

“dupla revolução:

a transformação industrial, iniciada e largamente confinada à Inglaterra, e a

transformação política, associada e largamente confinada à França”

.

22

Nesse momento de intensa transformação da sociedade, marcado

pelo pensamento iluminista burguês – que, no âmbito do direito penal,

tem Beccaria

23

(1738-1794) como grande expoente - e pelo capitalismo

como o melhor modo de produção possível, todo o discurso de

“liber-

dade, igualdade e fraternidade”

– a utopia burguesa revolucionária – cai

por terra, tornando-se mero discurso ideológico

24

, sem qualquer aplicabi-

lidade material. É nesse período também que, como uma resposta à toda

desigualdade, ao aumento da miséria e da exploração dos pobres, nascem

as correntes socialistas utópicas

25

(segundo a denominação marxiana), co-

21 Famosíssimo livro de Gabriel Ignacio Anitúa. Um verdadeiro clássico do estudo da criminologia, extremamente

completo. O título é autoexplicativo em relação ao tema abordado no mesmo.

22 HOBSBAWM, Eric J.

A era do capital.

15ª. Edição. São Paulo: Paz e terra, 2012, p. 22.

23 Cesare Beccaria, em seu clássico

Dei delitti e delle pene

(1764), fundamenta as bases do pensamento liberal e

utilitarista do direito penal burguês. Seu pensamento representa uma verdadeira ruptura em relação ao Estado abso-

lutista por ser contrário à pena de morte – uma vez que a pena, para Beccaria, deveria sacrificar a liberdade individual

o mínimo possível (eis a base do princípio da proporcionalidade) e que não poderia haver crime sem lei anterior que

o definisse (eis o princípio da reserva legal) – e à favor do livre-arbítrio, como característica inerente ao ser humano.

24 Sobre a relação entre ideologia e utopia, tal qual abordamos aqui, como transformação de um discurso libertário

em um discurso conservador hegemônico-dominante, ler:

As Aventuras de Karl Marx contra o barão de Münchhau-

sen,

de Michael Löwy.

25 Para um melhor entendimento dos termos

“socialismo utópico”

e

“socialismo científico”

, ler:

Do socialismo utó-

pico ao socialismo científico

, de Engels.