

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 356 - 375, jan - fev. 2015
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Bottomore nos explica:
“A mais-valia é a diferença entre esses dois valores:
é o valor produzido pelo trabalhador que é apropriado pelo capitalista sem
que um equivalente seja dado em troca. (...) o capitalista se apropria dos
resultados do trabalho excedente não pago”
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Marx elucidará, em seus
manuscritos
, para o fato de que essa re-
lação não é uma escolha do trabalhador, que só tem um direito material:
vender sua força de trabalho (um proletário), ao passo que o capitalista
tem o direito de comprá-lo. Eis uma prova cabal de que o trabalhador não
passa de uma mercadoria, mas uma mercadoria
sui generis
, devido a sua
capacidade de gerar valor.
Em outras obras, como a
Ideologia Alemã
(1845-1846), por exemplo,
Marx atacará a ideologia, que mascara todo esse processo material de ex-
ploração do homem pelo homem. A ideologia, para Marx, constituirá algo
falso, uma mentira que é reproduzida e está no cerne da sociedade civil bur-
guesa e em todas as suas instituições, sendo o direito, obviamente, uma de-
las. Numa suposta democracia, como é o caso brasileiro, temos a aparente
contradição com um direito penal extremamente autoritário. O fato dessa
contradição ser “aparente” se encerra no fato de que essa “democracia” é
puramente ideológica. Basta que atentemos para o fato de que os princí-
pios basilares da mesma (liberdade e igualdade, respaldados pelo princípio
da dignidade da pessoa humana) são meramente
formais
. É nesse sentido
que entendemos que a
luta de classes
permanece e a criminalização da
pobreza, a burocratização (e a proibição, em alguns quadros) do direito de
greve, o elitismo e lentidão da justiça (justiça para quem?) etc. são algumas
das formas de materialização da opressão legitimada pelo Estado.
Na edição brasileira da
Ideologia Alemã
, também há um texto
clássico e importantíssimo para a consolidação do pensamento marxia-
no: as
Teses de Feuerbach.
Em onze teses, Marx reformula o materialis-
mo feuerbachiano, explicando o que significa a concepção materialista
marxista. Na décima primeira tese, está descrito em poucas palavras o
conceito marxiano de
filosofia de práxis: “Os filósofos apenas interpre-
taram o mundo de diferentes maneiras; o que importa é transformá-lo”.
Com essa belíssima frase, Marx rompe com toda tradição filosófica ante-
rior a ele e dá um golpe certeiro no idealismo hegeliano. O que importa
é o mundo material; é a realidade econômica da sociedade que produz
as relações sociais. Nesse sentido, a filosofia não deve se contentar em
unicamente interpretar tais relações, o que importa é
transformá-las
.
16 BOTTOMORE, Tom.
Dicionário do pensamento marxista.
2ª. Edição. Rio de Janeiro: Zahar, 2012, p. 335.