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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 356 - 375, jan - fev. 2015

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camada mais pobre e miserável da população. São eles, como diriam os

supracitados pensadores, os

clientes do direito penal

. Nesse processo de

encarceramento por criminalização secundária operam os mais diversos

fatores: medo, preconceito de classe, estigmatização, estereotipação etc.

Os

inimigos do direito penal

e, portanto, os inimigos da sociedade

de classes possuem uma identidade bem específica - os pobres. É contra

eles que o direito penal, o processo penal, o sistema penal, as políticas cri-

minais e estratégias de segurança pública irrompem. Para os que duvidam

e tentam desconstituir essa análise óbvia (os “cientistas” e “jornalistas”

a mando do Capital), basta que se observe nas estatísticas de encarcera-

mento em todo o mundo os crimes que são apenados com mais frequên-

cia (os crimes contra a propriedade, de tráfico de drogas etc.). A simples

ideia de se legitimar esse direito penal significa legitimar a sociedade de

classes, a desigualdade, a crueldade, o punho de ferro contra os pobres.

Essa é a base da criminologia crítica.

Como já disse Malaguti,

não há nada de novo no front

. O que que-

remos dizer é que a estrutura que faz do direito penal aquilo que ele é não

mudou em nada. Continuamos em uma sociedade de classes que, com a

evolução do modo de produção capitalista, com a revolução tecnológica e

com a sempre presente política neoliberal, só sofisticou o poder punitivo.

Sobre isso, aponta Wacquant:

““mão invisível” do mercado do trabalho

desqualificado encontra seu prolongamento ideológico e seu complemen-

to institucional no “punho de ferro” do Estado Penal.”

38

Os índices de en-

carceramento produzidos pelo final do século XX (e que continuam com

crescimento acelerado nesse início de século) apontam para a verdadeira

falência do direito penal e dos discursos punitivistas. Nunca se prendeu

tanto e, ainda sim, alguém se sente seguro? Houve diminuição nos índi-

ces de criminalidade? Os clientes do direito penal encontram a prometida

ressocialização quando acabam de cumprir suas penas? A dignidade da

pessoa humana é respeitada pelo cárcere? Não.

Os discursos ideológicos legitimadores da pena estão, cada vez

mais, caindo por terra. No entanto, a grande maioria das pessoas continua

legitimando a pena. Nesse sentido, percebemos como o que Althusser

chamou de

“aparelhos ideológicos de Estado”

permanece com força total.

Trata-se do Estado, que Marx chamou de

“comitê para gerir os negócios

comuns de toda a classe burguesa”

39

.

38 WACQUANT, Loïc.

As prisões da miséria

. 2ª. Edição. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p.12

39 MARX, Karl; e ENGELS, Friedrich.

Manifesto Comunista

. São Paulo: Boitempo, 2007, p. 42.