

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 291 - 305, jan - fev. 2015
291
De Acusados de Vadiagem a
Condenados à Liberdade: Breve
Narrativa do Estado de Exceção
Vivido pela População em
Situação de Rua em Franca/SP
Caio Jesus Granduque José
Defensor Público do Estado de São Paulo. Doutoran-
do em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela USP.
Mestre em Direito pela UNESP.
“É curioso que haja ainda tantas pessoas razoáveis que não te-
nham percebido o caráter demente da justiça e o ridículo de seu
aparato: magistrados, advogados, testemunhas, etc” (
Pascal
Pia
,
Correspondance 1939-1947
)
O cáustico comentário de Pascal Pia, jornalista que se destacou no
movimento da Resistência francesa à ocupação pela Alemanha nazista
em virtude de seu trabalho como redator-chefe do jornal clandestino
Combat,
em carta datada de 2 de setembro de 1942, destinada ao ami-
go e também jornalista resistente Albert Camus, por ocasião da recen-
te publicação do seu romance
O estrangeiro
, que veio a se tornar um
clássico da literatura do século XX, permanece, surpreendentemente,
aplicável aos dias atuais.
1
Essa constatação, exarada numa atmosfera niilista em meio ao
combate às ideologias nazifascistas, fazia referência ao aparelho de Esta-
do judicial da Argélia colonial francesa, lastreado em paradigmas anacrô-
nicos que jamais permitiriam a percepção da absurdidade do mundo lar-
gamente constatada no pós-guerra após o anúncio nietzschiano da morte
1 CAMUS, Albert; PIA, Pascal.
Correspondance 1939-1947
. Paris: Fayard; Gallimard: 2000,. p. 101.