Background Image
Previous Page  275 / 590 Next Page
Basic version Information
Show Menu
Previous Page 275 / 590 Next Page
Page Background

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 264 - 275, jan - fev. 2015

275

iliberal pode efetivamente anular as garantias estabelecidas em favor do

acusado, em nome da defesa social a todo custo

. Como já mencionado

por Voltaire, a propósito do princípio do livre convencimento do juiz, sua

virtude estava vinculada aos juízes, a quem competiria aplicá-lo. Este avi-

so demonstra uma outra circunstância,

o processo é ligado à cultura do

tempo e à cultura são inerentes os princípios da lógica que conduzem às

decisões jurisdicionais

.

30

A legislação processual penal brasileira autoritária, por sua vez, so-

brevive há mais de 70 anos. Apesar de toda a modulação operada por

reformas pontuais e pela emergência de uma constituição democrática e

“garantista”, a estrutura segue regida pelos mesmos elementos culturais

inerentes à práxis inquisitória, em especial a lógica da verdade real e o pa-

pel que o magistrado, desde aí, assume na condução da instrução. Poder-

-se-ia, ainda, mencionar a forma escrita que ainda prevalece, malgrado a

opção legal pelo processo oral (após a Lei 11.719/2008).

De tudo o que se expôs, é possível concluir que os ranços autori-

tário-inquisitórios são ainda vigentes, não apenas no âmbito legal, mas,

principalmente, através da cultura inquisitória que está impressa no DNA

das práticas judiciárias brasileiras. Nada obstante, ressalte-se que tal cul-

tura não pertence exclusivamente aos magistrados, mas é compartilhada

por membros do Ministério Público, advogados, professores, estudantes,

delegados de polícia, etc.

Neste panorama, considerando que a lei e/ou a Constituição não

são capazes de, isoladamente e em curto prazo, modificar a cultura foren-

se (esta vigente há séculos), impõe-se um grande desafio à interpretação

constitucional do direito processual penal, que possivelmente só encon-

trará êxito num horizonte longínquo que, quiçá, depende da formação

político-jurídica que será recebida pelas novas gerações de juristas.

30 BETTIOL, Giuseppe; BETTIOL, Rodolfo.

Istituzioni di diritto e procedura penale

. 7ª ed. Pádua: CEDAM, 2000, p. 128-9.

[Tradução livre de: “

Esiste dunque un nesso tra forma di Stato e forma del processo. Laddove prevalga l’idea dello Stato di

Diritto, ove il cittadino è appunto tale, munito di diritti soggettivi inviolabili, il processo tende all’ampiamento delle garan-

zie difensive e quindi al rito accusatorio. Laddove il rapporto Stato-cittadino è squilibrato a favore esclusivo del primo le

garanzie difensive vengono indebolite o eliminate ed il processo tende quindi ad essere inquisitorio. Un’avvertenza si rende

peraltro necessaria. Se esiste uno stretto rapporto genetico tra forma di Stato e forma del processo, il rapporto peraltro

non va inteso in sensomeccanicistico. La forma di Stato puòmutare ed il processo vigente in precedenza esseremantenuto

in vigore. È il caso tipico della Repubblica Italiana. Il codice del regime fascista, pur con molte modifiche è rimasto in vigore

per oltre cinquant’anni. Esiste un peso della tradizione, per il quale non vi è un automatico adeguamento tra la forma

dello Stato e la forma del processo. Ancora, va ricordato come il processo sia fatto non solo di norme astratte, ma di prassi

concrete. Un codice illiberale può essere interpretato liberalmente, e viceversa il codice più garantista applicato con ottica

illiberale può vanificare di fatto le garanzie dettate a favore dell’imputato, in nome delle difesa sociale a tutti costi. Come

già faceva notare Voltaire a proposito del principio del libero convincimento del giudice, la bontà dello stesso era legata ai

giudici che lo dovevano applicare. Questo richiamo dimostra un’ulteriore circostanza, il processo è legato alla cultura del

tempo e nella cultura sono insiti i principi della logica che portano alla decisione giurisdizionale

.”]