Background Image
Previous Page  266 / 590 Next Page
Basic version Information
Show Menu
Previous Page 266 / 590 Next Page
Page Background

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 264 - 275, jan - fev. 2015

266

mento econômico do Brasil. A despeito das roupagens corporativistas, o

seu Estado Novo era uma criação altamente pessoal.

3-4

Nos campos político e jurídico do regime, desponta o nome de

Francisco Campos, alcunhado Chico Ciência, como o principal teórico

estado-novista e um dos grandes teóricos do autoritarismo no Brasil.

Nomeado Ministro da Justiça dias antes do golpe de 1937, coube a Cam-

pos a missão de redigir (quase exclusivamente) a Constituição de 1937,

além de articular a criação de um novo Código Penal (que foi promul-

gado em 1940) e a unificação da legislação processual (Código de Pro-

cesso Civil, em 1939, e o Código de Processo Penal, em 1941). Note-se,

ainda, que Francisco Campos é o autor do texto do Ato Institucional n.º

1 (o AI-1), do golpe militar de 1964.

5

Em sua obra “O Estado Nacional:

sua estrutura, seu conteúdo ideológico”, que constitui uma coletânea de

artigos, entrevistas e discursos, Campos promove uma tentativa de fun-

damentação teórica do regime baseada numa suposta inaptidão do mo-

delo liberal-democrático à resolução daquilo que designa por “grandes

tensões políticas”, propondo o estado autoritário como única solução

exequível. Em suas palavras:

"O clima das massas é o das grandes tensões politicas, e as

grandes tensões politicas não se deixam resolver em ter-

mos intellectuaes, nem em polemica de idéas. O seu pro-

cesso dialectico não obedece ás regras do jogo parlamen-

tar e desconhece as premissas racionalistas do liberalismo.

Com o advento politico das massas, a irracionalidade do

processo politico, que o liberalismo tentara dissimular com

os seus postulados optimistas, torna-se de uma evidencia

3 SKIDMORE, Thomas.

Brasil: de Getúlio a Castelo, 1930 a 1964

. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982, p. 53-4.

4 No mesmo sentido, afirma Célio da CUNHA que “o novo regime não tinha unidade doutrinária, ainda que muito

teóricos, como Francisco Campos e Azevedo Amaral, quisessem ver nele uma nova ordem social e política. (...). Em

documentos oficiais e em obras que procuraram teorizar o Estado Novo, às vezes se constata o que poderíamos

chamar aqui de doutrina do Estado Novo. Na prática, entretanto, a conduta de Getúlio, multíplice por excelência,

‘recuando aqui para recuperar alhures’, fazia do Estado Novo um Estado híbrido. A composição de seu ministério

atesta este hibridismo. Francisco Campos, oligarca-autoritário, ocupa a pasta da Justiça. Eurico Dutra no Ministério

da Guerra e Filinto Müller como chefe da Polícia são simpatizantes do fascismo e do nazismo. Para contrabalançar,

Souza Costa na Fazenda, Gustavo Capanema na Educação e Oswaldo Aranha nas Relações Exteriores, não se incluem

entre os autoritários, sendo que a indicação de Oswaldo Aranha agradou aos americanos. Assim, Vargas tinha repre-

sentantes para todas as tendências, no plano interno e externo. Por essa época, o nazi-fascismo europeu ganhava

terreno. Através de um jogo duplo, Vargas soube tirar proveito da situação” (

Educação e autoritarismo no Estado

Novo.

2ª ed. São Paulo: Cortez, 1989, p. 30-1.

5 O cronista Rubem Braga teria dito: “Toda vez que o Sr. Francisco Campos acende sua luz, há um curto-circuito

nas instalações democráticas brasileiras” (Cf. AQUINO, Rubim Santos Leão de;

et al

.

Sociedade brasileira: uma

história através dos movimentos sociais: da crise do escravismo ao apogeu do neo-liberalismo

. Rio de Janeiro:

Record, 2007, p. 377).