

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 221 - 230, jan - fev. 2015
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4.2. Sonegação de informações requisitadas e os crimes de prevaricação
e desobediência
É um grande equívoco técnico-dogmático afirmar-se que o
servidor
público
não pode figurar como sujeito ativo, pois, referindo-se a ordem
recebida a funções suas poderá configurar o delito de prevaricação. Na
verdade, isso não ocorre por várias razões, inclusive porque o
crime de
prevaricação
tem suas próprias peculiaridades, além de exigir o
fim espe-
cial
, qual seja, “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, enquanto
este crime não exige elemento subjetivo algum. Aliás, comentando sobre
o crime de
prevaricação
, em determinada passagem fizemos a seguinte
afirmação,
verbis
: “É indispensável, por fim, que a ação ou omissão do
funcionário público seja praticada para satisfazer
interesse
ou
sentimen-
to pessoal
, constituindo uma característica fundamental que distingue a
prevaricação
de outros crimes da mesma natureza."
Com efeito, essa particularidade diferenciadora dos demais crimes
similares foi uma introdução do grande Código Criminal do Império, reco-
nhecido mundialmente como um dos melhores diplomas legais codifica-
dos do século XX, distanciando-se, no particular, do não menos extraor-
dinário Código Penal francês, de 1810. Com efeito, passou-se a exigir que
a infidelidade funcional com descumprimento ou violação de dever fun-
cional tivesse uma
causa psicológica
, que o atual Código Penal de 1940
sintetizou com o
especial fim de satisfazer interesse ou sentimento pesso-
al
. No entanto, como essa satisfação de interesse ou sentimento pessoal
constitui elementar subjetiva especial do injusto, vamos examiná-la mais
detidamente no tópico seguinte”
2
.
Por outro lado, ainda que houvesse grande semelhança com o cri-
me de prevaricação, este seria afastado pelo princípio da especialidade,
destinando-se à situação específica, inclusive com sanções mais graves.
Por outro lado, tampouco confunde-se com o crime de
desobediên-
cia
(art. 330), qual seja, “desobedecer a ordem legal de funcionário públi-
co”, o que, visivelmente, constitui crime subsidiário, cujas sanções penais
são quinze dias a seis meses de detenção e multa. O crime de desobedi-
ência é tipo penal aberto, simples, objetivo e singelo. Examinando essa
infração penal tivemos oportunidade de afirmar: “A conduta incriminada
consiste em
desobedecer
ordem legal
de funcionário público, que signi-
fica descumprir, desobedecer, desatender dita ordem. É necessário que
2 Cezar Roberto Bitencourt.
Tratado de Direito Penal,
7ª ed., São Paulo, Saraiva, 2013, v. 5.