

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 185 - 205, jan - fev. 2015
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Nesta perspectiva, implementa-se um verdadeiro processo de cri-
minalização dos movimentos sociais. A resposta policial em regra tem sido
absolutamente desproporcional e muitas vezes violenta e gratuita, antes
mesmo de qualquer excesso por parte dos manifestantes. Prisões arbitrá-
rias e desnecessárias, truculência e uso abusivo de armas não letais dão a
tônica da atividade policial na “contenção dos distúrbios civis”.
A utilização indiscriminada de armas não letais tem aberto um am-
plo debate sobre os limites ao uso da força na atividade policial. Há regis-
tros de mortes de manifestantes que inalaram grande quantidade de gás
lacrimogênio e gás de pimenta
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. Há ainda inúmeros registros de pessoas
atingidas por balas de borracha no rosto e outras regiões sensíveis. Tam-
bém foi observada a utilização de bombas de gás lacrimogênio e gás de
pimenta fora do prazo de validade, fato que pode acarretar sérios danos à
saúde da pessoa atingida pela substância.
Vale destacar que a ação policial nos protestos não possuía o es-
copo de dispersão dos manifestantes, mas sim almejava encurralar os
mesmos e forçá-los a serem atingidos pelos efeitos das armas não letais,
ou talvez melhor denominadas armas menos letais. Deixa-nos crer que o
objetivo maior ensejado pelas forças policiais era infligir sofrimento aos
manifestantes, de modo a servir ao objetivo pedagógico de convencê-los
a não aderir aos próximos protestos.
Os resultados poderiam ter sido ainda mais graves, diante do pedi-
do do Comandante da PMERJ para a utilização de armas letais nas mani-
festações. Como se trata de circunstância na qual é frequente a exaltação
de ânimos de ambas as partes, um policial municiado de arma letal pode-
ria fazer uso inadequado, evidentemente, resultando em uma catástrofe.
O uso de armas letais na contenção de “distúrbios civis” é altamente te-
merário e contraria recomendação da ONU.
Se o uso excessivo da força ocasionou casos pontuais de vítimas
letais, não se pode dizer o mesmo da ação do aparato repressivo nas áreas
periféricas. A Polícia Militar do Rio de Janeiro é conhecida por sua altís-
sima letalidade, empreendida sobretudo nas favelas e demais periferias
urbanas. Este
habitus
letífero confirmou-se na repressão a um dos pro-
testos, este realizado nas proximidades da Favela da Maré. Após receber
denúncia da prática de furtos na manifestação, a PMERJ deslocou-se para
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http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2013/08/mp-e-pm-apuram-se-ator-morreu-por-inalar-gas-lacrimogeneo--em-ato-no-rio.html.