

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 185 - 205, jan - fev. 2015
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No entendimento da OAB, o conteúdo do decreto carece de cons-
titucionalidade
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. “A Constituição Federal assegura a inviolabilidade das
comunicações entre pessoas. Não tenho a menor dúvida em afirmar que
o decreto é flagrantemente inconstitucional”, salientou Marcus Vinícius
Furtado, Presidente da OAB. “Apenas a Justiça detém o poder de determi-
nar a quebra do sigilo”, ressaltou.
Diante da repercussão negativa, o Governador decidiu baixar novo
Decreto, que revoga o anterior, fazendo principalmente duas alterações
36
.
Primeiro, ao tratar das competências da Comissão Especial de Investiga-
ção de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas, ressalta que “ob-
servar-se-á a reserva de jurisdição exigida para os casos que envolvam
quebra de sigilo”. A outra alteração é na menção específica a empresas de
telefonia e provedores. O primeiro Decreto dizia que “as empresas Ope-
radoras de Telefonia e Provedores de Internet terão prazo máximo de 24
horas para atendimento dos pedidos de informações da CEIV”. O novo
texto não faz mais citação expressa a prazo determinado.
Convém destacar que invariavelmente, os discursos de manuten-
ção da ordem que buscam deslegitimar as grandes mobilizações em curso
buscam atribuir aos manifestantes a pecha de vândalos e baderneiros.
Ademais, sempre que há excessos no uso da força policial, afirma-se que
houve confronto com os policiais.
O etiquetamento dos manifestantes enquanto vândalos trata-se de
estratégia criminalizante que remonta os preceitos da doutrina do Direi-
to Penal do Inimigo. A teoria esposada por Jakobs preconiza que diante
de algumas categorias sociais, como criminosos econômicos, terroristas,
delinquentes organizados, autores de delitos sexuais e outras “infrações
penais perigosas” seria possível suspender garantias penais e processuais
penais dos réus. Em síntese, inimigo seria aquele que supostamente se
afasta de modo permanente do Direito e não oferece garantias cognitivas
de que vai continuar fiel à norma
37
.
Nesta concepção o indivíduo que não admite ingressar no estado
de cidadania, não pode participar dos benefícios do conceito de pessoa.
O inimigo, por conseguinte, não é um sujeito processual, logo, não pode
35 "Decreto de Sérgio Cabral é inconstitucional, diz presidente da OAB nacional". Disponível em:
http://www1.folha.
uol.com.br/poder/2013/07/1315596-decreto-de-cabral-e-inconstitucional-diz-presidente-da-oab-nacional.shtml.
36 "Sob pressão, Sérgio Cabral muda decreto e inclui ordem judicial para quebra de sigilo". Disponível em: http://
convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=34363.
37 JAKOBS, Günter & CANCIO MELIÁ, Manuel.
Derecho Penal del Enemigo.
Navarra: Editorial Aranzadi, 2006, p. 39.