

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 185 - 205, jan - fev. 2015
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contar com direitos processuais. Contra ele não se justifica o devido pro-
cesso legal, mas sim, um procedimento de guerra.
A utilização de tal entendimento com o fulcro de criminalização dos
movimentos sociais abre uma ampla discussão doutrinária em interface
com a Teoria do Estado e a Filosofia do Direito acerca da pertinência da
desobediência civil e do direito de resistência em face do autoritarismo,
como hipóteses supralegais de exclusão da ilicitude.
Neste sentido, entende Juarez Cirino:
“Autores de fatos qualificados como desobediência civil são
possuidores de dirigibilidade normativa e, portanto, capazes
de agir conforme o direito, mas a exculpação se baseia na exis-
tência objetiva de injusto mínimo, e na existência de motivação
política ou coletiva relevante, ou, alternativamente, na desne-
cessidade de punição, por que os autores não são criminosos
– portanto, a pena não pode ser retributiva e, além disso, a so-
lução dos conflitos sociais não pode ser obtida pelas funções de
prevenção especial e geral atribuídas à pena criminal”
38
.
Do exposto, ao trilhar as teses do Direito Penal do Inimigo, o
jus pu-
niendi
em sua sanha punitiva acolhe o discurso de guerra ao inimigo, deixan-
do de agir enquanto um Estado
sub lege,
para impor um Estado
contra lege.
3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
À luz da ordem constitucional pós-88, a duras penas conquistada
na luta contra o autoritarismo, todo o sistema penal, com destaque para
o Direito Penal, deve atuar a serviço do Estado Democrático de Direito.
Através da limitação do próprio poder punitivo, na obstaculização da
violência institucional, visando, acima de tudo, à defesa da dignidade
humana, epicentro de nossa ordem jurídica.
Nesse sentido, não podem ser consideradas compatíveis com a de-
mocracia políticas criminais que caracterizam o Estado Penal, o Estado de
Polícia, como: mandados de busca e apreensão genéricos, prisões provi-
sórias arbitrárias, proliferação dos autos de resistência, uso dos blindados
caveirões, emprego das Forças Armadas para fins de policiamento, execu-
ções sumárias, superlotação e precarização dos presídios.
38 SANTOS, Juarez Cirino dos.
Direito Penal
– parte geral. 3ª ed. Lumen Juris, Curitiba, 2008.