

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 16 - 68, set - dez. 2014
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A manobra remete a
culpa
ou a responsabilidade pela prescrição
para o Judiciário. Afinal, a Administração se desincumbiu da sua atribui-
ção e ajuizou a execução às vésperas do dia em que completado o quinto
ano. Ainda por cima, a Administração despreza os prazos do CPC quanto
às formalidades da citação, porque se escora na súmula 109 do STJ e, pra-
ticamente, a gestão cartorária de uma vara da Fazenda Pública tem sido
sustentada por servidores e estagiários cedidos pelo Executivo.
Por sua vez, uma Lei Complementar atribuiu ao juiz um poder de
mágico, pois o seu despacho, de pronto, interrompe a prescrição. A essên-
cia das coisas jurídicas não é tão simples, seja no
antes
, no
durante
e no
depois
da prescrição. Sempre deve ser observado um trâmite inerente ao
formalismo do direito tributário e do processo de execução fiscal, o que
conduz o art. 174, parágrafo único, I, do CTN, a ser uma regra
secundum
eventum citationis.
O prazo prescricional de cinco anos não deve ser contado para au-
tolegitimar a burocracia. O lustro legal merece uma contagem de acordo
com a perspectiva que, além de assegurar um prazo razoável à Fazenda
Pública, também garanta a tutela dos direitos individuais do contribuinte
– o valor justiça impõe tal ponderação. Portanto, impossível dizer que um
prazo corre contra a Administração e outro prazo, totalmente diverso, co-
meça quando simplesmente protocolada uma petição junto ao Judiciário.
O ser humano é apenas um, o Estado é apenas um, e o prazo da prescrição
– não interessa a qual instituição/órgão beneficie – existe para tutelar o
direito de cada qual.
O prazo de cinco anos é um direito fundamental do indivíduo, de
maneira que seria inconstitucional e violador da dignidade da pessoa hu-
mana, que tal prazo não fosse um “patrimônio de cada função ou de cada
poder estatal”. O prazo não é uma potestade da Administração pública e/
ou do Judiciário.
Estudar e aplicar o discurso da separação dos poderes, como se
a Administração fosse incomunicável ao Judiciário, remete aos vetustos
moldes elucubrados pela Revolução Francesa, em um esquema que rear-
ticula a política da burguesia daquela época e permaneceu indiferente à
pessoa humana e aos valores do Estado do antigo regime. A neutralidade
do velho Estado de Direito francês, que algum conservadorismo brasileiro
ainda defende, é mais ideológica que propriamente jurídica. Ora, o lobo
da neutralidade é o mais disfarçado contrafluxo de uma ideologia. Se an-