

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 16 - 68, set - dez. 2014
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repercussão na esfera jurídico-penal”
46
. Em virtude da função que eles de-
sempenham, porque apontam diretamente aos valores do sistema jurídico,
os direitos fundamentais prevalecem sobre as demais normas, consistindo
em pedras de toque do Estado Constitucional.
Os
direitos fundamentais afirmam valores
e, assim, passam a incidir
sobre a totalidade do ordenamento jurídico, iluminando todas as tarefas do
Legislativo, do Executivo e do Judiciário
47
(o que os qualifica de direitos ubi-
quitários
48
). Disso se infere o caráter democrático e social do Estado brasileiro
(e dos Estados nacionais articulados pelo constitucionalismo do pós-guerra),
porque os poderes instituídos nesses e por esses Estados se reforçam princi-
piológica e valorativamente
49
. As instituições estão vinculadas não somente
à lei, mas atendem a um esquema de “juridicidade”
50
(bloco de normas que
protegem os direitos), tanto quanto as próprias relações dos particulares en-
tre si (eficácia horizontal e a eficácia vertical com repercussão lateral
51
).
Portanto,
não basta que uma lei seja complementar
– como a
LC118/05 – e modifique o art. 174 do Código Tributário Nacional. Somado
ao aspecto da forma, é decisivo que as normas da lei modificadora pres-
tigiem o conteúdo da Constituição e, ainda, o conteúdo da racionalidade
jurídica que ilustra o sistema. Os itens acima discutiram sobre esse último
ponto de compatibilização; agora, chama-se a atenção para a base valorati-
va que está cravada logo no primeiro artigo da Constituição
52
, em especial,
o valor da “dignidade da pessoa humana”.
46 SARLET, Ingo Wolfgang. "Direitos fundamentais e proporcionalidade: notas a respeito dos limites e possibilidades
da aplicação das categorias da proibição de excesso e de insuficiência em matéria criminal."
In
GAUER, Ruth Maria
Chittó (org.).
Criminologia e sistemas jurídico-penais contemporâneos.
Porto Alegre: EdiPucrs, 2008, p. 213.
47 MARINONI, Luiz Guilherme.
Técnica processual e tutela dos direitos.
3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 131.
48 MATTOS, Sérgio Luís Wetzel de.
Devido processo legal e proteção de direitos
. Porto Alegre: Livraria do Advo-
gado, 2009, p. 147.
49 Assente que os valores se diferenciam dos princípios e das regras. Assim como as regras, os princípios atuam no
plano deontológico, no plano do dever-ser, e possuem natureza mais aberta que em relação às regras; de outro lado,
os valores ilustram todas as normas do sistema – sejam elas regras ou princípios – e, portanto, subjazem a todas
as tarefas estatais e, sobremaneira, estruturam e legitimam as políticas e suas opções públicas, tanto as de ordem
genéricas como as de natureza casuística. A atuação em um plano axiológico afirma o que é o “melhor” e consta
acertado democraticamente na Constituição. ÁVILA, Humberto Bergmann. "A distinção entre princípios e regras e a
redefinição do dever de proporcionalidade."
RDA
215, p. 165.
50 Existem duas ordens de “juridicidade”: uma juridicidade no sentido formal, que trata da força normativa no senti-
do de vigência das normas (assim como fazia a velha legalidade clássica); e uma juridicidade que remete o operador
a uma faceta substancial das normas, porque além de vigentes, as normas devem respeitar o conteúdo principioló-
gico e valorativo previsto na Constituição. Somente o atendimento dos requisitos de forma e da substância confere
validade e aplicabilidade às normas jurídicas dos tempos atuais.
51 Marinoni,
Técnica
, op. cit.
, p. 181/7.
52 O dispositivo estabelece: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados
e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a
soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”