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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 16 - 68, set - dez. 2014

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Lei de Execuções Fiscais não afirma que ‘o homem morreu’, como afirma-

va o art. 739 do CPC. Mas afirma que seu coração parou de bater, que sua

atividade cerebral cessou e que seu funeral já foi concluído. Expressões

distintas que, contudo, têm o mesmíssimo sentido”

42

.

Desencontros dogmáticos poderão ser observados em uma inter-

pretação sincrônica. Agora, em termos diacrônicos, o raciocínio remete

o observador de volta a um fundamento epistêmico: enquanto o CPC de

1973 e a LEF de 1980 eram ditados por uma racionalidade que lhes con-

feriam a natureza jurídica de uma relação jurídica de direito público, atu-

almente, as reformas que modificam tanto o CPC como a LEF lhes reputa

a natureza jurídica de um procedimento em contraditório. As contínuas

reformas das leis processuais tendem a adequar

43

o processo ao direito,

adequar o processo ao seu objeto, mas nem sempre as modificações da

legislação processual alcançam todo e qualquer objeto

44

.

Uma reforma legislativa – quando pontual, quando focada em um

artigo de lei – não possui o condão de modificar a natureza das coisas. O

novo termo para a interrupção da prescrição estabelecido pela LC 118/05

não vive sozinho no mundo jurídico. Ele reporta a essência do art. 8º,

§ 2º da LEF, mas esse mesmo dispositivo deve observar a totalidade do

processo (o formalismo) para a sua plena aplicabilidade. O art. 8º, § 2º da

LEF, por imposição do art. 1º dessa lei, reclama a orientação do art. 219

do CPC. Todos convivem juntos e com a mesma dose de normatividade.

Ambos os perfis epistêmicos não permitem que a prescrição da pre-

tensão de cobrança do crédito tributário seja interrompido apenas com a

ordem de citação no despacho inicial do juiz. O despacho deve ser sucedido

da citação, seja porque o procedimento subentende a sequência de atos

na série, ou seja porque a relação jurídica supõe dois sujeitos e um objeto.

42 MACHADO, Hugo de Brito. "Execução fiscal. Pesquisas tributárias." Nova série, n. 14. São Paulo:

Revista dos

Tribunais,

2008.

43 Um processo sumário ou um processo especial nada mais representa que um processo adaptado a uma posição

jurídica preordenada pelas peculiaridades do direito material. Assim acontece com a execução fiscal, quando diversos

privilégios são predispostos à Fazenda Pública, outrora invencível tutora do interessa público – lembro que a lei é de

uma época na qual interesse público era intangível à pessoa, pois não se tinha uma visão do direito individual como

componente da seara pública, muito menos uma noção que o direito individual reproduz o núcleo da teoria da justiça.

44 Uma visão do processo pode sustentar uma reforma pontual, mas uma reforma pontual (de um dispositivo, que

seja) não consegue sustentar uma visão de processo. Trata-se da noção de sistema e de sua funcionalidade: as coisas

jurídicas estão preordenadas de maneira pretensamente harmônica, no entorno de um princípio reitor normativo

e que sobremaneira subentende uma hierarquia e um diálogo entre as fontes. Uma perspectiva cada vez mais lem-

brada não apenas pelos clássicos jusfilósofos positivistas (como a tríplice entente de Kelsen, Bobbio e Hart), como

também pelos teóricos de uma visão de justiça pela integridade (vide "Dworkin e a noção de integridade do direito

repristinada e/ou convencionada, uma justiça com amparo na tradição", e Richard A. "Posner com a formação prag-

mática da justiça, uma justiça existencialista").