

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 16 - 68, set - dez. 2014
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A Escola processualista, que ilustrou o CPC
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, também é res-
ponsável pela sorte de influências que nortearam a formulação da Lei
6.830/80. Uma racionalidade que reproduz efeitos teóricos e prag-
máticos até o presente, mormente quando a matéria subjacente – o
objeto do processo: o direito tributário – é de cunho tão formalista
quanto o próprio processo. Daí o fundamento epistêmico pelo qual as
reformas
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pontuais elaboradas recentemente ao CPC (Lei 11.382/06)
não despertam uma imediata aplicação, quando do manejo da execu-
ção fiscal.
Uma bifurcação de correntes epistêmicas sobrepaira: de um
lado, a nova ordem mundial compreende o processo civil como um
procedimento em contraditório, assim embasando dispositivos como
o art. 40 da LEF; de outro lado, um perfil abstracionista e outrora res-
ponsável pela autonomização do processo reinava quando do adven-
to do CPC e da própria LEF, fincando raízes para entender o processo
como uma relação jurídica. O abismo epistêmico entre as duas corren-
te é dantesco.
A lei especial número 6.830/80 foi criada para conferir privilé-
gios processuais à Fazenda Pública. Deve, portanto, seguir o forma-
lismo do direito tributário para tutelar tais interesses supremos. O
dualismo extremo entre o processo e o direito material, que sobre-
fora responsável para afastar o processo da realidade que ele tende a solucionar com a justiça. Até a consagração do
processualismo, existia uma visão plana do ordenamento jurídico, na qual Dinamarco refere que “a ação era definida
como o direito subjetivo lesado (ou: o resultado da lesão ao direito subjetivo), a jurisdição como sistema de tutela
aos direitos, o processo como mera sucessão de atos (procedimento)”. Para aprofundar a sequência entre as corren-
tes metodológicas, na ordem, sincretismo, processualismo ou autonomismo e instrumentalismo, ver DINAMARCO,
Cândido Rangel.
A instrumentalidade do processo
. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 18. Finalmente, também
se fala no formalismo-valorativo, corrente que é defendida no decorrer dessa exposição.
34 Merece referência a soberba literal do item “I”, alínea “5”, da Exposição de Motivos do CPC de 1973: “diversa-
mente de outros ramos da ciência jurídica, que traduzem a índole do povo através de longa tradição, o processo
civil deve ser dotado exclusivamente de meios racionais, tendentes a obter a atuação do direito”. Além de retirar do
povo (os verdadeiros detentores do poder) e, consequentemente, do próprio cenário da cultura, a força de coesão
para colaborar com a formação do direito – entropias de influência do social sobre o âmbito do jurídico –, parece
que o processo civil, segundo o CPC do século passado, não pretendeu “se misturar” a outros ramos da ciência
jurídica, sendo intuitiva uma fragmentação do direito em compartimentos estanques do conhecimento, como se
fosse possível entender institutos através de uma leitura em tiras incomunicáveis. Tampouco se admitia um efetivo
diálogo entre as fontes normativas, uma aproximação real entre direito e processo, o que, atualmente, são mecâni-
cas indispensáveis a uma própria dicção do que é racional ou razoável em termos jurídicos.
35 As reformas do CPC, bem como as reformas da própria LEF (nova redação dos parágrafos do art. 40), assinalam o
vértice epistêmico acolhido pelo legislador: na esteira da contemporânea doutrina do século XX, o processo é com-
preendido como um procedimento em contraditório. Logo, o processo sempre deve andar para a frente.