

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 249 - 286, set - dez. 2014
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to da medida (que sempre sustenta caráter de absoluta excepcionalidade,
ou seja, em caso de dúvida, quanto à efetiva presença dos pressupostos, a
não concessão da medida liminar deve ser a regra
) em virtual prejuízo do
próprio instituto cautelar, com flagrante resultado de desprestígio à jus-
tiça, em termos gerais, e ao Poder Judiciário, em particular, podendo até
mesmo vir a constituir-se em instrumento capaz de produzir uma excep-
cional e teórica situação analógica de
periculum in mora
inverso contra a,
em princípio, intangível acepção maior do
Estado-juiz
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.
“A concessão, indiscriminadamente transformada em verdadei-
ra benesse, vem retirando a seriedade do denominado remédio
heróico, enfraquecendo o
writ
como
remedium iuris
excepcio-
nal, em desprestígio da própria justiça enquanto instituição. E,
não raras vezes, após a concessão da
liminar
, o mandado não
é provido, mas o fato já se tornou irreversível e consumado. A
concessão de liminar há, portanto, de ser precedida de criterio-
so estudo, só se concedendo em caso de iminente e irreparável
lesão. A concessão de
liminar
há, portanto, de ser precedida de
criterioso estudo, só se concedendo em caso de iminente e irre-
parável lesão.
A concessão indiscriminada de medidas liminares
poderá levar ao referendo de caprichos e procrastinações, às
vezes irreversíveis, com desprestígio do próprio Poder Judiciário
(...)” (OLIVEIRA, 1988, p. 194) (grifos nossos).
22 Condições fundamentais para a ampla aceitação do Judiciário pela sociedade - LUHMAN (apud FALCÃO, 1992,
p.7) aponta três condições fundamentais para o Poder Judiciário ser aceito pela sociedade: a) produzir decisões
(sentenças); b) implementar decisões; e c) solucionar ou minorar, de forma real, o conflito aparentemente resolvido
na sentença.
Embora a primeira condição pareça óbvia porque todos, aparentemente, vão ao Judiciário para buscar uma deci-
são (na realidade fática), esta condição preliminar não só não é óbvia, como ainda é de difícil operacionalização
porquanto (talvez, até na maioria dos casos) os jurisdicionados não buscam no Poder Judiciário propriamente uma
decisão e, sim, buscam, na maioria dos casos, evitar esta mesma decisão.
O aparente paradoxo, no entanto, é resolvido pela simples observação da prática judiciária do dia a dia. Por exemplo,
quantas pessoas, de fato, preferem recorrer à Justiça, através de medidas cautelares (com previsão liminar), para,
através, de pseudogarantias de fiança bancária, deixar, - ou pelo menos adia
r sine die
- de recolher importante
volume de tributos ao fisco, sob os mais diversos argumentos que mais tarde - ou mesmo concomitantemente em
processo equivalentes - são julgados improcedentes ou, na verdade, não possuíam qualquer chance real de êxito?
Quanto inquilinos, segundo o próprio exemplo de FALCÃO (ob. cit.), preferem recorrer ao Judiciário a pagar o au-
mento do aluguel contratado, apostando num eventual acordo com o proprietário premido pela lentidão de uma
solução final (ou de uma eventual anistia fiscal, no primeiro caso)?
Portanto, nem mesmo podemos afirmar que a primeira condição para o Judiciário ser aceito pela sociedade encon-
tra-se, de forma plena e absoluta, satisfeita.