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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 16 - 68, set - dez. 2014

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O mundo da vida não permite conceitos estanques nesse quadran-

te cultural. O cenário contemporâneo exige ductibilidade

12

. Em termos

de processo civil, apesar de alguns institutos ou de atos buscarem funda-

mentos genéticos em normas do direito material, isso não significa que os

seus efeitos jurídicos pertençam somente ao direito material de origem.

Existem atos que nascem no direito material, mas brotam no processo (e

vice-versa), e daí produzem certos efeitos no cenário do processo.

Aqui o ponto: existem atos – a exemplo da prescrição – que possuem

uma natureza jurídica de instituto do direito material, todavia, dependem

do processo para que sejam regulados ou promovidos os seus efeitos.

Em um sistema jurídico que proíbe a autotutela, a interrupção da

prescrição da pretensão de cobrança dos créditos é um mecanismo que

reclama a orientação normativa das leis do processo. Seja a prescrição da

pretensão fundada no direito civil, ou a prescrição da pretensão fundada

no direito público, tanto faz, pois elas retiram a sua essência da teoria

geral do direito. Quando estudado o fenômeno da prescrição, o tráfego

entre direito e processo é ainda mais aproximado.

Na verdade, a relativização dessas fronteiras se torna delicada na

hipótese de se estudar qualquer entidade do direito público (seja o direito

criminal, o direito administrativo ou o direito tributário, entre outros). O

fundamento de uma mitigação mais acentuada reside na epistemologia

do caráter “público” da seara do direito no qual se analisa a prescrição.

A programação linguística que o direito público utiliza é uma série

de mensagens formais, verdadeiros

formalismos

, pois o trato da “coisa

pública” reclama um maior rigor por parte dos seus operadores. Com o

respaldo do princípio da indisponibilidade e do princípio da supremacia,

vale dizer que o interesse público não pertence a ninguém em particular,

mas pertence a todos os indivíduos da coletividade e à própria coletivi-

dade enquanto pessoa jurídica com pretensão de universalidade. Nesses

termos, a gestão dos interesses públicos merece uma atenção redobra-

da

13

, desperta um

rigor formal

que, por decorrência, acaba aproximando

ainda mais o direito material ao processo.

12 Se o dualismo é uma realidade teórica e legislativa, merecendo ser tratado como um ponto de partida para uma

racionalidade analítica, o

ponto de chegada

deve permitir e promover a tutela dos direitos no mais amplo sentido

das soluções. Portanto, pesquisar o processo civil à distância do direito material (ou vice-versa) é uma aventura do

desserviço ao homem. Os problemas do homem do terceiro milênio reclamam a instrumentalidade e o diálogo das

fontes, a maleabilidade.

13 Um estudo dos fundamentos de algumas coisas jurídicas facilmente explicita que o caráter da indisponibilidade

do direito também trafega nos direitos denominados “privados”. Basta examinar facetas do direito de família, que

a conclusão advém ao natural: o caráter social do direito que define a maior ou menor possibilidade de disposição

do interesse em pauta.