

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 17, n. 66, p. 214 - 248, set - dez. 2014
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foi crescendo e criando corpo, através da inserção de importantes regras
para inscrição e pagamento dos créditos ali mencionados, até o final da
vigência da Constituição de 1967.
E assim, mesmo diante das discrepâncias e estranhezas deflagra-
das nessa metodologia, especialmente desenvolvida para o pagamento
de condenação pecuniária judicialmente imposta à Fazenda Publica brasi-
leira, em razão de impenhorabilidade de seus bens, desde então ela vem
sendo mantida no ordenamento jurídico brasileiro.
1.2. O precatório na vigência da Constituição de 1988
A vigente Constituição de 1988 foi promulgada em importantíssimo
momento histórico, marcando a transição de um Estado autoritário e in-
tolerante para um Estado Democrático de Direito
25
.
Por isso, diferentemente das Cartas anteriores, a vigente Constitui-
ção não é mero instrumento de dominação ideológica, calcada em falsas
promessas, ou mesmo dissociada da legislação ordinária ou da realidade
existente. Ela ocupa o topo da pirâmide legislativa
26
, funcionando como
tábua axiológica de valores e filtro hermenêutico para a leitura de todas
as outras normas jurídicas, conferindo, assim, unidade ao sistema
27
.
No que tange ao pagamento das condenações judiciais pecuniárias
impostas à Fazenda Pública, é de se ver que a vigente Constituição mante-
ve a sistemática dos precatórios.
25 ... “em um Estado Democrático de Direito não subsiste a dualidade cunhada pelo liberalismo, contrapondo o
Estado e a sociedade. O Estado é formado pela sociedade e deve perseguir os valores que ela aponta.”
in
BARROSO,
Luís Roberto,
Curso de Direito Constitucional Contemporâneo
- Os conceitos fundamentais e a construção do novo
modelo, Saraiva, 2012, p. 92.
26 “Todas as normas cuja validade pode ser reconduzida a uma e mesma norma fundamental formam um sistema
de normas, uma ordem normativa. A norma fundamental é fonte comum da validade de todas as normas pertencen-
tes a uma e mesma ordem normativa, o seu fundamento de validade é comum. O fato de uma norma pertencer a
uma determinada ordem normativa baseia-se em que o seu último fundamento de validade é a norma fundamental
desta ordem. É a norma fundamental que constitui a unidade de uma pluralidade de normas enquanto representa
o fundamento da validade de todas as normas pertencentes a essa ordem normativa.” Hans Kelsen,
Teoria pura do
direito
, 1979, p. 269.
27 TEPEDINO, Gustavo, "Normas constitucionais e Direito Civil na construção unitária do ordenamento",
in
Temas de
Direito Civil
, tomo III, Ed. Renovar, Rio de Janeiro, 2009, p. 03-19. Ainda sobre o tema, vale citar Maria Celina Bodin
de Moraes em "A caminho de um direito civil constitucional" – Artigo publicado na
Revista Estado de Direito e Pro-
priedade
, volume 1º, 1991, publicação do Departamento de Ciências Jurídicas da PUC/RJ: no Estado Democrático
de Direito, delineado pela Constituição de 1988, que tem entre seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e
os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o antagonismo público-privado perdeu definitivamente o sentido.
Os objetivos constitucionais de construção de uma sociedade livre, justa e solidária e de erradicação da pobreza
colocaram a pessoa humana — isto é, os valores existenciais — no vértice do ordenamento jurídico brasileiro, de
modo que tal é o valor que conforma todos os ramos do Direito.