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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 63 (Edição Especial), p. 115 - 125, out. - dez. 2013
dos pelas mães dos garotos, pensamos: o que podemos fazer com isso?
Que centros de atenção nós temos? Temos infraestrutura, mas ninguém
tinha pesquisado quais eram os centros de saúde para atenção a isso.
Necessitamos de internação compulsória de só uma semana em
casos de crise. Ninguém dava ordem de internação compulsória por uma
semana em casos de crise, nem os juízes de família porque não entendiam
nada. O médico forense não queria ir para a favela. A polícia não sabia o
que fazer. Conseguimos os veículos, concentramos os processos, as de-
núncias, numa vara federal. Conseguimos sequestrar alguns milhões de
doses através de uma brigada policial especializada nisso. Imediatamen-
te, houve uma reação dos donos da pequena caixa, porque são máfias
de bairro, não são máfias internacionais; não temos cartéis, são máfias
locais, do bairro. Contudo, havia contribuição a certas caixas policiais e o
resultado disso foi uma campanha contra mim, depois internacional tam-
bém, foi refletida num papelzinho sujo que vocês têm, que se chama
Re-
vista Veja
, acho que vocês usam no banheiro também.
O que observamos como resultado de tudo isso foi que nos hospi-
tais não existia protocolo de tratamento, porque os garotos são pobres,
os garotos são miseráveis. A morte desses garotos não seria parte de um
genocídio? Melhor, ficam menos.
Estamos pesquisando homicídios. O levantamento dos homicídios
na cidade de Buenos Aires é muito interessante. Temos uma meia-lua vio-
lenta de favelas no sul. Ali na favela o índice de homicídios é mais ou
menos 17 por 100 mil pessoas. No resto da cidade, o índice é de 3,5 por
100 mil pessoas, ou seja, no resto da cidade temos um índice de homicídio
semelhante à Europa ou ao Canadá. Na favela, temos dezessete. A maio-
ria dos homicídios na favela não é investigado; ninguém sabe quem foi, ou
seja, estamos tendo mortos de primeira categoria e mortos de segunda
categoria. E os mortos de segunda não têm muita importância. Os mortos
de primeira saem nos jornais – aqui seria a
Rede Globo
, e lá o
Clarín
–, são
notícia de primeiro plano. O senhor que foi morto na garagem, no carro,
não sei; esses 3,5 saem no jornal, temos um a cada mês. Esse mês se re-
petiu a cada dia, então parece que temos trinta a cada mês.
Quais são as causas das mortes na favela? Pelo que temos estudado
até agora, é a concorrência entre grupos que lutam entre si. Na grande
Buenos Aires, temos mortes policiais. Às vezes, são fatos violentos da po-
lícia, mas outras vezes não. Se a polícia mata, o outro criminalizado mata