Revista da EMERJ (Edição Especial) nº 63 - page 123

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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 16, n. 63 (Edição Especial), p. 115 - 125, out. - dez. 2013
ção é fazê-los matar entre eles, criando contradições. O policial mata um
bandido, o bandido mata um policial. Matam-se entre eles. Enquanto con-
tinuarmos sem redistribuir renda, vamos ter mão de obra para toda essa
economia violenta que tem uma função genocida. E se, além disso, joga-
mos uma droga genocida, muito melhor, é funcional. Não é que alguém
esteja criando tudo isso; não é que alguém está deixando isso acontecer
porque é bom; não pensem que existe alguém com poder de criar isso.
Não é possível. Mas, tem sim o poder de dizer: “Vamos deixar isso ir para
frente porque é funcional, está bem, é útil”.
Há um filósofo contemporâneo que está analisando desde a Europa
bastante bem o que está acontecendo na nossa região. Fala que os Esta-
dos Unidos têm uma política de guerra dupla, uma guerra para fora e uma
guerra para o interior. A política reacionária, aquela política do governo
Bush, essa política declarou uma guerra interna aos marginalizados das
grandes cidades, das grandes concentrações urbanas dos Estados Unidos.
Efetivamente, os Estados Unidos foram um país normal, com seu sistema
penal com algumas dificuldades, mas normal, até os anos 80 do século
passado. O seu sistema penal e os índices de prisonização eram mais ou
menos os correntes no mundo. Desde 1980, no entanto, disparou o índice
de prisonização. Os Estados Unidos são, hoje, os campeões da prisoniza-
ção. Têm dois milhões e meio de presos, uma coisa completamente doida,
absurda. Passaram a Rússia que era a campeã histórica da prisonização. E
mais da metade dos presos são afro-americanos. Está muito claro qual é o
setor. Tentaram definir nesses trinta anos de política repressiva; tentaram
conter a marginalização urbana pelo poder punitivo. Ao mesmo tempo,
tentam conter os países subdesenvolvidos. Isso não é novo na história.
O positivismo do século XIX fazia a mesma coisa. O criminoso nato de
Lombroso era comparado com o selvagem, e o selvagem éramos nós, os
colonizados. O próprio Lombroso falava claramente em “O homem delin-
quente”, que o criminoso nato tem características africanas ou asiáticas,
ou seja, mais ou menos parecido com os índios, com os africanos, os co-
lonizados, os selvagens.
Aplicam a mesma política e concebem também uma instituição
que foi trazida da Colônia, que é a polícia. Não a polícia como a polícia
norte-americana; não a polícia comunitária, mas a polícia de ocupação
territorial. Nós, na América Latina, copiamos a Constituição dos Estados
Unidos, mas não copiamos a polícia dos Estados Unidos; copiamos a
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