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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 191 - 209, Setembro/Dezembro. 2017

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O Estado, cuja atuação como agente econômico foi reconhecida a

partir do século XX, passou a harmonizar a atuação de seus órgãos e enti-

dades à sua nova condição. Contudo, verifica-se uma potencial mudança

apenas a partir da última quadra do referido século, quando a ascensão

do modelo neoliberal nos Estados Unidos da América e no Reino Unido

propôs uma nova forma de gestão pública, baseada nos resultados e na efici-

ência dos servidores: trata-se do modelo gerencial de administração pública.

O modelo de administração pública gerencial sucedeu ao modelo bu-

rocrático e pode ser considerado um mecanismo de limitação da intervenção

estatal na economia, com a participação cada vez maior da iniciativa privada

e do assim chamado terceiro setor

14

. Não se objetiva aniquilar o conceito de

Estado, como se poderia acreditar numa primeira análise, o que redundaria

em caracterizar o neoliberalismo como um movimento de política econômi-

ca derivado de um inconsequente anarcocapitalismo.

Todavia, como hodiernamente ocorre em países emergentes, o Brasil

adotou o modelo neoliberal na década de 1990

15

, sem adequá-lo corretamen-

te à sua matriz cultural latino-americana, resultando em severas consequên-

cias à economia nacional quando da crise asiática em 1997

16

.

14 Uma das formas de se classificar os agentes econômicos é sua divisão em setores: o “primeiro setor” corresponderia ao

Estado como agente econômico; o “segundo setor” seria composto pelas pessoas jurídicas de direito privado e empreen-

dimentos típicos da iniciativa privada; e o “terceiro setor” seria composto por organizações não governamentais suprain-

dividuais, que lidam hodiernamente com interesses coletivos e difusos (conhecidas popularmente como organizações não

governamentais ou ONGs), que podem interagir com o Estado por meio de instrumentos específicos, como os contratos

de gestão, termos de parceria, dentre outros (geradores de figuras como as Organizações Sociais, Organizações da Socie-

dade Civil de Interesse Público e Serviços Sociais Autônomos). Conceito didático de terceiro setor pode ser aferido dos

dizeres de Rubem César Fernandes, que apresentou artigo jornalístico quando do início do uso da expressão no Brasil,

in

verbis

: “

A expressão foi traduzida do inglês –

third sector –

e faz parte do vocabulário sociológico corrente nos Estados Unidos. No Brasil,

começa a ser usada com naturalidade por alguns círculos ainda restritos. É cedo, portanto, para saber se vai vingar entre nós, mas vale a pena

discuti-la, pois carrega implicações que a todos importam. Nos Estados Unidos, costuma ser usada paralelamente a outras expressões, entre as

quais se destacam: a primeira diz ‘organizações sem fins lucrativos’ (

non profit organizations

), que significa um tipo de instituição cujos

benefícios financeiros não podem ser distribuídos entre seus diretores e associados. A segunda, ‘organizações voluntárias’, tem um sentido comple-

mentar ao da primeira. Se o lucro não lhes é permitido e se, como também se supõe, não resultam de uma ação governamental, depreende-se que

sua criação seja fruto de um puro ato de vontade de seus fundadores. E mais, deduz-se ainda que duram no tempo, em grande medida, graças a

um conjunto complexo de adesões e contribuições igualmente voluntárias

” (FERNANDES, Rubem César.

O que é o terceiro setor?

Revista do Legislativo n. 18. Belo Horizonte: Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, abr./jun. 1997, p. 26).

15 Os maiores expoentes normativos da adoção do modelo neoliberal e da administração pública gerencial no Brasil

foram as Leis 8.031/1990 e 9.491/1997, que compõem o assim chamado “Plano Nacional de Desestatização”, desen-

volvido durante o exercício da Presidência da República por Fernando Collor de Mello (1990-1992), Itamar Franco (1992-

1995) e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

16 Para maiores detalhes sobre a crise econômica asiática, por todos: cf. KAPLAN, Ethan; RODRIK, Dani.

Did The

Malaysian Capital Controls Work?

. Cambridge: Harvard University, 2001, p. 393-440. Em um primeiro momento do

referido artigo científico, os autores questionam o modelo econômico, político e jurídico da Malásia, país que se constituiu

em epicentro da crise asiática de 1997, apregoando a necessidade de mecanismos de controle efetivos do Estado no mer-

cado de valores mobiliários,

in verbis

: “

The first issue is narrowly financial: Were the controls effective in segmenting Malaysian financial

markets from offshore and international capital markets? The increased sophistication of financial markets, and in particular the spread of

derivatives (enabling speculators, for example, to disguise short-term flows as direct foreign investment), has led many observers to be skeptical

of governments’ ability to target specific types of balance-of-payments flows for restriction. Indeed, one might have been doubtful

ex ante

that