

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 191 - 209, Setembro/Dezembro. 2017
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proposta de conceito para princípios e a importância de suas prescrições são
expostos por Celso Antônio Bandeira de Mello,
in verbis
:
“Cumpre, pois, inicialmente, indicar em que sentido estamos a
tomar o termo princípio, tal como vimos fazendo desde 1971,
quando pela primeira vez enunciamos a acepção que lhe estáva-
mos a atribuir. À época dissemos: ‘Princípio é, pois, mandamen-
to nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição
fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-
-lhes o espírito e servindo de critério para a exata compreensão
e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racio-
nalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tônica que lhe
dá sentido harmônico’. Eis porque: ‘violar um princípio é muito
mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao prin-
cípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento
obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. (...)”.
1
Não obstante existirem outras definições para princípios jurídicos
2
,
sustenta-se sua qualificação como espécie de norma jurídica, a lhe imprimir
as características de bilateralidade, abstração, generalidade, imperatividade e
coercibilidade, típicas das normas jurídicas primárias.
O princípio da livre concorrência encontra-se expressamente deline-
ado no art. 170, IV, da atual Constituição do Brasil (CRFB/1988), sendo
a primeira
Lex Mater
a consagrar o referido princípio. A construção do
referido princípio deu-se apenas em tempos recentes: desde a Constituição
de 1934 apregoa-se a observância da “
Liberdade Econômica
”
3
, e a partir da
Constituição de 1937 fixou-se o princípio da livre iniciativa
4
, mas apenas em
1988 o Estado brasileiro filiou-se de forma plena ao modelo capitalista então
vigente nos países de matriz anglo-saxã há mais de um século.
1 Cf. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio.
Curso de Direito Administrativo
. 27ª Ed. São Paulo: Malheiros Edi-
tores, 2010, p. 53. O referido estudioso afirma que transgredir um princípio é mais odioso para o Direito que infringir
uma norma, sendo a “
mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado
” (op. cit., p. 53).
2 Por todos, Robert Alexy, que define os princípios jurídicos como “mandados de otimização”, abertos à ponderação, ao
contrário das regras que teriam o caráter de “mandados definitivos”,
in verbis
: “
El punto decisivo para la distinción entre reglas
principios es que los principios son mandados de optimización mientras que las reglas tienen el carácter de mandados definitivos
” (ALEXY,
Robert.
El concepto y la validez del derecho
. 2ª Ed. Barcelona: Gedisa, 1997, p. 162).
3 Constituição do Brasil de 1934, art. 115: “
A ordem econômica deve ser organizada conforme os princípios da Justiça e as necessidades
da vida nacional, de modo que possibilite a todos existência digna. Dentro desses limites, é garantida a liberdade econômica
”.
4 Constituição do Brasil de 1937, art. 135: “
Na iniciativa individual, no poder de criação, de organização e de invenção do indivíduo,
exercido nos limites do bem público, funda-se a riqueza e a prosperidade nacional. A intervenção do Estado no domínio econômico só se
legitima para suprir as deficiências da iniciativa individual e coordenar os fatores da produção, de maneira a evitar ou resolver os seus conflitos
e introduzir no jogo das competições individuais o pensamento dos interesses da Nação, representados pelo Estado. A intervenção no domínio
econômico poderá ser mediata e imediata, revestindo a forma do controle, do estímulo ou da gestão direta
”.