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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 137 - 160, Setembro/Dezembro. 2017
A mesma preocupação foi externada nos votos dos Ministros Ricardo
Lewandowski e Marco Aurélio (no deste segundo, talvez até com maior in-
tensidade do que a contida no voto do Ministro Dias Toffoli)
8
.
Exposto o fundamento empregado pelos ministros vencidos, passa-se a
um olhar mais detido sobre a matéria. Porém, antes de se adentrar no cerne
da questão proposta, há que se aclarar uma indagação preliminar: porque se-
lecionar, dentre os múltiplos aspectos que circundam o debate sobre o regime
sucessório do companheiro, justamente o argumento fundado na liberdade?
3. NOVOS CONTORNOS DA LIBERDADE NO DIREITO CIVIL
É conhecida a percepção histórica do Direito Civil como terreno no
qual se reconhece a mais ampla liberdade aos particulares, encontrando esta
pontuais limitações:
O direito civil foi identificado, a partir daí, com o próprio
Código Civil, que regulava as relações entre as pessoas priva-
das, seu estado, sua capacidade, sua família e, principalmente,
sua propriedade, consagrando-se como o reino da liberdade in-
dividual. Concedia-se a tutela jurídica para que o indivíduo,
isoladamente, pudesse desenvolver com plena liberdade a sua
atividade econômica. As limitações eram as estritamente neces-
sárias à viabilidade da convivência social.
9
Essa concepção, porém, não restou imune ao amplo processo de trans-
formações sociais ocorrido ao longo do século XX, culminando, no Brasil
e alhures, no fenômeno conhecido como
constitucionalização do Direito
Civil
10
.
O
princípio da liberdade
, que no âmbito da civilística era traduzido
pelo conceito da
autonomia da vontade
, é significativamente impactado por
esse giro paradigmático
11
, ao ponto de se verificar a substituição da expressão
clássica pela referência a uma
autonomia privada
.
Enquanto a autonomia da vontade expressava a vasta liberdade do
sujeito de regular o seu patrimônio em conformidade com a sua vontade
8 A manifestação oral dos ministros pode ser assistida em:
<https://www.youtube.com/watch?v=ZQDVuD9Rops>.
Acesso em 15.06.2017.
9 BODIN DE MORAES, Maria Celina. “A Caminho de um Direito Civil-Constitucional”. In: BODIN DE MORAES,
Maria Celina. Na Medida da Pessoa Humana: estudos de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar. 2010. p. 4-5.
10 TEPEDINO, Gustavo. “Premissas Metodológicas para a Constitucionalização do Direito Civil”. In: TEPEDINO,
Gustavo. Temas de Direito Civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2008. p. 7-13.
11 Referido por Luiz Edson Fachin como uma verdadeira “virada de Copérnico”.