

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 101 - 124, Setembro/Dezembro. 2017
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pede e quem pede. Ora, o que levaria ao governador de um Estado perder
seu tempo movendo uma ação para algo que não atinge seu Estado? Ou o
que levaria a um sindicato mover ação para discutir lei que não atinge os
trabalhadores da categoria que defende? Exigir a demonstração desse requi-
sito pode parecer incialmente, portanto, algo razoável e, até mesmo, lógico.
Contudo, faz-se necessário mergulhar na natureza jurídica do processo de
controle de constitucionalidade e nos princípios que o norteia, para se che-
gar a conclusões mais maduras.
4. PROCESSO OBJETIVO
Hans Kelsen sustentou no século passado que seria mister a existência
de um mecanismo para que se pudesse extirpar da ordem jurídica eventuais
normas que fossem contrárias à Constituição. Sucede que o autor austríaco
não defendeu a atribuição dessa tarefa a todos os juízes, como segue o mode-
lo norte-americano, mas sim a uma Corte Constitucional especializada. Essa
Corte atuaria de maneira abstrata e concentrada.
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Esse modelo kelseniano
passou a ser bem aceito, como destacam Daniel Sarmento e Cláudio Pereira
de Souza Neto:
“A sugestão de Kelsen foi acolhida na Constituição austríaca
de 1920, bem como na Constituição da Checoslováquia do
mesmo ano. Depois da II Guerra Mundial , a concepção kelse-
niana do controle de constitucionalidade exerceu grande influ-
ência no delineamento do sistema de jurisdição constitucional
de diversos outros Estados europeus. Ao longo da segunda me-
tade do século XX, houve progressiva tendência de expansão da
jurisdição constitucional em todo o mundo, com a sua atual
adoção pela ampla maioria dos países, espalhada por todos os
continentes.”
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Essa concepção foi absorvida pelo Brasil e, como consequência, os
processos que tramitam no nosso Supremo Tribunal Federal para analisar
de maneira abstrata a constitucionalidade das leis são dotados de caracterís-
ticas especiais em relação aos demais modelos processuais tradicionais, eis
que o interesse abrangido na demanda não coincide inexoravelmente com
32 KELSEN, Hans.
Jurisdição Constitucional.
Tradução Alexandre Krug. 2ª Edição. São Paulo. Martins Fontes, 2006,
p. 123-186.
33 SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel;.
Direito Constitucional: teoria, história e métodos de
trabalho
. Op.Cit p. 32.