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ARTIGOS

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Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 23, p. 47-100, 2º sem. 2015

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existe uma grande lacuna entre uma e a outra construção, resvalando-se

de uma para outra, e não apenas nos usos do conceito, mas também em

nosso cotidiano enquanto mulheres de carne e osso (Sardemberg, 2014).

Nesse sentido, o conceito de gênero veio responder a vários desses

impasses e permitir analisar tanto as relações de gênero quanto a cons-

trução da identidade de gênero em cada pessoa. O conceito de gênero

foi trabalhado inicialmente pela antropologia e pela psicanálise, situando a

construção das relações de gênero na definição das identidades feminina

e masculina, como base para a existência de papéis sociais distintos e hie-

rárquicos (desiguais).

Esse conceito coloca nitidamente o ser mulher e ser homem como

uma construção social, a partir do que é estabelecido como feminino e

masculino e dos papéis sociais destinados a cada um. Por isto, gênero, um

termo cedido da gramática, foi o vocábulo escolhido para distinguir a cons-

trução social do masculino e feminino do sexo biológico.

Para a promotora de justiça Valeria Scarance.

(…) nenhum homem agride ou humilha a mulher no primeiro encon-

tro. A dominação do homem se estabelece aos poucos. Inicialmente há a

conquista e sedução. Depois, sob o manto do cuidado, tem início o contro-

le, o isolamento da mulher dos amigos e familiares. Seguem-se ofensas, re-

baixamento moral e agressão física. Estabelecem-se regras: chegar cedo,

não fazer barulho, não usar roupas provocantes, não falar com outros ho-

mens, cozinhar e cuidar dos filhos, todas “para o bem da mulher e família”.

O descumprimento dessas regras naturalizadas na relação justifica para o

homem o ato violento e faz com que a vítima seja culpada pela violência.

1. Circunstâncias que configuram as “razões de condição

de sexo feminino”

Devemos observar, no entanto, que não é pelo fato de uma mulher

figurar como sujeito passivo do delito tipificado no art. 121 do Código Pe-

nal que já estará caracterizado o delito qualificado, ou seja, o feminicídio.

Para configurar a qualificadora, nos termos do § 2-A, do art. 121 do diploma