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ARTIGOS
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Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 23, p. 47-100, 2º sem. 2015
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Vara Criminal da Comarca de Anápolis em Goiás, da lavra da Juíza Ana Clau-
dia Veloso Magalhães (Processo n. 201103873908, TJGO).
A transexualidade caracteriza-se por uma contradição entre a identi-
dade sexual ou de gênero com o sexo biológico, o que causa uma dificul-
dade terminológica. Pode ser considerada, portanto, mulher transexual o
indivíduo que nasce com anatomia masculina e se identifica com o gênero
feminino, e como homem transexual a pessoa que nasce com anatomia
feminina, identificando-se com o sexo masculino.
A mulher transexual é uma pessoa adulta que se identifica como sen-
do do sexo e gênero femininos, embora tenha sido geneticamente — e
oficialmente, pelos pais, quando do nascimento — designada como per-
tencente ao sexo masculino. Portanto, em virtude da incongruência sexo
versus mente (ou cérebro), uma mulher transexual reivindica o reconheci-
mento social e legal como mulher.
Tal quais as mulheres genéticas, as mulheres transexuais adotam
nome, aparência e comportamentos femininos em razão de sua necessi-
dade de querer e necessitar ser tratadas como quaisquer outras mulheres.
Além disso, a alteração que a Lei sofreu pouco tempo antes de ser
aprovada, que substituiu o vocábulo “gênero” pela expressão “condição de
sexo feminino”, na verdade não altera a interpretação, já que a expressão
“por razões de sexo feminino” prende-se, igualmente, a razões de gênero.
O legislador não almejou trazer uma qualificadora para amorte demulheres.
Se assim fosse, bastaria ter colocado: Se o crime for cometido contra mu-
lher, sem utilizar a expressão “por razões da condição de sexo feminino”.
Esse posicionamento é diverso do defendido por Thiago Mota (2015),
no qual expõe que “somente as pessoas a quem o direito reconhece (ci-
vilmente) como mulheres podem ser o passivo do crime”, mas comenta
a possibilidade de a transexual ser vítima do crime de feminicídio se esta
tiver feito a cirurgia de redesignação de gênero e alterado o registro civil.
Portanto, entendemos que toda vez que uma mulher, assim entendi-
do como toda pessoa que se identificar com o gênero feminino, indepen-
dentemente da realização da cirurgia de mudança de sexo, for morta em
razão desta condição, incidirá a qualificadora do feminicídio.