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ARTIGOS
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Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 16 - n. 1, p. 15-41, 1º sem. 2018
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4 Sugestões para a atuação do Poder Judiciário brasileiro
Como visto, ainda não há no Brasil um tratamento legislativo sobre o
superendividamento. Não obstante, a doutrina, por meio de estudos com-
parativos (como o esboçado na primeira parte deste artigo), fornece ins-
trumentos que, com as devidas adaptações, podem ser manejados pelos
órgãos de defesa do consumidor (administrativamente), bem como pelo
Poder Judiciário brasileiro.
Para atuar em um caso de superendividamento, o magistrado precisa
ter duas ideias em mente: 1) deve ser tutelada, de uma só vez, a integrali-
dade do patrimônio do consumidor (todo o seu ativo e todo o seu passi-
vo); 2) trata-se de um plano de recuperação de pessoa física insolvente,
que deve observar duas funções, quais sejam a satisfação dos credores e a
preservação de condições mínimas para a vida digna do consumidor.
Ademais, em comparação ao ordenamento francês, devem ser feitas
as seguintes ponderações: 1) oBrasil não possui autorização legislativa para
que os juízes concedam o restabelecimento pessoal (perdão das dívidas)
com ou sem liquidação judicial; 2) o Brasil não permite a imposição judicial
de um plano de recuperação aos credores de pessoa física insolvente.
Por outro lado, devem ser feitas as seguintes diferenciações quanto
ao tratamento do superendividamento (LIMA, 2014, p. 135-136):
1) Não se trata de um conjunto de ações revisionais, pois estas depen-
dem de situação imprevisível ou inevitável que implique desequilíbrio no
sinalagma contratual, ou seja, que recaia sobre a contratação. De modo di-
verso, a impossibilidade de adimplemento do consumidor superendivida-
do é “fato subjetivo e pessoal” e, portanto, não condizente com as ações
revisionais, que não comportam a imposição de alteração contratual em
prejuízo exclusivo de uma das partes, no caso, o fornecedor;
2) Não se trata de mera ação de insolvência civil, pois esta não se
presta ao tratamento do consumidor superendividado, uma vez que nada
mais é do que uma espécie de execução coletiva dos bens do devedor que
objetiva a satisfação dos credores sob a forma de concurso universal.