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ARTIGOS
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Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 16 - n. 1, p. 15-41, 1º sem. 2018
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5 Considerações Finais
A falta de legislação específica não impede que o Poder Judiciário
(para além do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor) realize a tutela
do consumidor superendividado. Os motivos para a mobilização judicial
em prol dessa situação de hipervulnerabilização remontam ao princípio da
dignidade da pessoa humana e ao mínimo existencial.
O estudo de ordenamentos estrangeiros fornece subsídios para a ma-
ximização da utilidade de institutos jurídicos de que o Brasil já dispõe, via-
bilizando sua aplicação ao tratamento do superendividamento. Particular-
mente, o modelo francês é bastante acolhido pela doutrina pátria, pois os
efeitos jurídicos dele decorrentes são consentâneos às previsões brasileiras
de responsabilização por dívidas e ao direito de satisfação dos credores.
Da transposição do
code de la consommation
para a legislação nacio-
nal, despontam possibilidades de atuação do Judiciário no Brasil. Todas
elas convergem para o fomento da conciliação (ou mediação) do devedor
com a totalidade de seus credores, tendo em vista que o adequado trata-
mento do superendividamento depende do enfrentamento global de suas
dívidas (em uma espécie de concurso de credores).
Trata-se da negociação de um plano de pagamento de dívidas (com
medidas dilatórias, revisionais, extintivas, dentre tantas outras previstas
na França) que possibilite a maximização das chances de recebimento por
parte dos credores e, principalmente, a manutenção do mínimo existencial
do devedor, por meio da preservação de parcela de sua renda para a ga-
rantia de suas despesas básicas e as de sua família (
reste à vivre
), que deve
ser destacada do montante periódico de reembolso.
Os magistrados podem fomentar a composição das dívidas em um
momento extraprocessual (por meio de “núcleos de superendividamen-
to”, em especial nos Juizados Especiais) ou mesmo no curso do processo,
a partir do poder de negociação de direitos disponíveis conferido às partes
pelo ordenamento processual civil.
Tratar o superendividamento é medida humanitária. Mas, além dis-
so, é instrumento que otimiza o patrimônio do devedor, tornando-o útil