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Direito em Movimento, Rio de Janeiro, v. 16 - n. 1, p. 193-211, 1º sem. 2018
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DECISÕES COMENTADAS
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deve afastar, de uma vez por todas, qualquer resquício de
abordagem patologizante da questão, que não se coadu-
na com um Estado democrático que respeita os indivíduos
enquanto tais e lhes confere, a todos, igual estima social.
Deve-se, ao contrário, estabelecer um novo paradigma nor-
mativo que coloque o reconhecimento em seu centro e que
consiga refletir de forma complexa e não binária sobre a
identificação da pessoa humana.
Um entendimento semelhante, utilizado pela ótica do Sistema Peni-
tenciário, pautou a decisão do Supremo Tribunal Federal objeto deste en-
saio. O julgado, cujos fundamentos jurídicos serão comentados a seguir,
representou um importante avanço para a população LGBTT ao garantir a
transferência de duas travestis para uma unidade prisional feminina.
2. A decisão do Supremo Tribunal Federal e o respeito ao
princípio fundamental da dignidade da pessoa humana
A bem lançada decisão doMinistro Luís Roberto Barroso, do Supremo
Tribunal Federal, determinou a transferência de duas travestis presas na
Penitenciária de Presidente Prudente (SP) para um presídio feminino. Fun-
damentou o eminente Ministro na Resolução Conjunta nº 1, de 15.04.2014,
do Conselho Nacional de Combate à Discriminação; edaResoluçãoSAPnº 11,
de 30.01.2014, do Estado de São Paulo.
Ambas estão presas desde dezembro de 2016 na Penitenciária de Pre-
sidente Prudente (SP). Uma delas, de acordo com os votos do ministro,
dizia estar dividindo o mesmo espaço com 31 homens, “sofrendo todo o
tipo de influências psicológicas e corporais”. Ao decidir o caso, o ministro
extinguiu o processo sem resolução do mérito, citando o entendimento ju-
risprudencial que aponta a
inadmissibilidade do uso da ação de
habeas cor-
pus
em substituição ao recurso ordinário previsto na Constituição Federal
,
mas deferiu de ofício a transferência das pacientes, nos seguintes termos:
10. Sem prejuízo disso, a notícia de que o paciente
e o corréu fo-
ram incluídos em estabelecimento prisional incompatível com
as respectivas orientações sexuais autoriza a concessão da or-
demde ofício
, na linha da Resolução Conjunta nº 1, de 15.04.2014,