

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 79, p. 121 - 142, Maio/Agosto. 2017
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Constata-se, portanto, a incompatibilidade do programa municipal
de reassentamento dos moradores removidos com os parâmetros internacio-
nais aos quais o Brasil se vincula. Os moradores são deslocados para zonas
distantes do local da moradia original, o que acarreta a perda da identidade
socioterritorial do indivíduo
52
. Ademais, são áreas caracterizadas pela au-
sência de infraestrutura e serviços públicos, o que viola condição de habita-
bilidade, segundo o conteúdo do direito à moradia adequada adotado pela
ONU e o sistema interamericano juridicamente vinculante ao País.
Ligado a tamanhas transformações urbanas, ocorre, ao lado das re-
moções, o fenômeno de gentrificação
53
. Tal fenômeno é responsável por
alterar, de forma direta, as dinâmicas de bairros ou regiões, por meio de uma
valorização. Dessa forma, os custos de bens e serviços aumentam, obrigando
moradores de baixa renda a se deslocarem para outros locais. A gentrifi-
cação ocorre, por exemplo, na zona portuária do Rio. O chamado Porto
Maravilha, o Museu do Amanhã, o Museu de Arte do Rio (MAR), o Veículo
Leve sobre Trilhos (VLT) e o AquaRIo (promessa de ser o maior aquário da
América Latina) são grandes empreendimentos de parceria público-privada,
que empurram as populações locais para outras localidades. As famílias,
então, começam a se instalar em áreas da zona oeste da cidade, localidades
com baixa infraestrutura. A qualidade de vida dessa população é reduzida,
enquanto seu direito de usufruir das melhoras ocorridas na cidade é negado.
Como consequência de todo esse movimento, aumentam-se as disparidades
sociais e se instaura o que por muitos sociólogos é chamado de guetização,
devido à criação de verdadeiras comunidades marginalizadas.
5. Conclusão
O direito à moradia não se resume à propriedade de um espaço físico.
Por isso, ainda que o indivíduo não seja titular da propriedade, ele é titular
de um direito mais amplo, qual seja, de moradia adequada, que abriga um
leque amplo de outros direitos humanos ligados à existência digna do in-
divíduo. A garantia do direito à moradia adequada não impede, todavia, a
realização de remoções forçadas, desde que observados os parâmetros inter-
nacionais. Contudo, diante da dinâmica das remoções forçadas dos últimos
anos, na cidade do Rio de Janeiro, nota-se que o Estado brasileiro não respei-
ta suas obrigações internacionais relacionadas à moradia adequada.
52 FAULHABER; AZEVEDO, op.cit., p. 40.
53 Idem, 2015, pp. 18-19.