

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 107 - 123, Janeiro/Abril. 2017
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Pelo CDC, a responsabilidade civil surge com o fato danoso (art. 14),
enquanto que, na Lei 12.965/2014, exige, para a sua configuração a condu-
ta do consumidor em promover uma ação judicial (art. 19) ou notificar o
provedor (art. 21).
Por qual razão os provedores de aplicação, que são fornecedores de
produtos e serviços, teriam um modelo de responsabilidade diferente dos
demais e, ainda, mais oneroso ao consumidor?
A responsabilidade civil subsidiária do art. 21 é totalmente diferente
do CDC: naquela norma busca-se proteger o provedor de aplicação; nesta, vi-
sa-se garantir o pleno ressarcimento do consumidor (arts. 13, I
23
e 28, §3°
24
)
Portanto, o Marco Civil da Internet não é a “Constituição da Inter-
net”, que tanto se prometeu, mas o “Código de Defesa dos Provedores”.
É uma norma que estabelece diversas medidas de defesa dos provedo-
res de aplicação, criando exceções às regras protetivas do CDC.
Exige, no caso do art. 19, a judicialização para a configuração da
responsabilidade do provedor, trazendo o ônus para o consumidor. Passa a
surgir de um fato processual.
Se essa responsabilidade só surge a partir de um fato processual, ela
estimula a negligência dos provedores, que recebem “carta branca” para não
atender a qualquer solicitação extrajudicial do usuário ofendido
25
.
Essa judicialização, além de contribuir para o aumento da quantidade
de processos em trâmite – um sério problema da realidade brasileira - entra
em conflito com o Novo CPC, que prestigia a arbitragem e a mediação.
Portanto, o Marco Civil diminuiu as proteções garantidas pelo Códi-
go de Defesa do Consumidor, razão pela qual se questiona a constituciona-
lidade dos arts. 19 a 21.
A Constituição Federal prestigia a defesa do consumidor em dois
pontos: no rol de direitos e garantias (art. 5ª, XXXII); e, ainda, ao defini-la
como um dos princípios da ordem econômica (art. 170, V).
23 Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando: I - o fabricante, o constru-
tor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;
24 § 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.
25 Nesse sentido, Marcelo Thompson: “O que o Marco Civil traz, portanto, é um instrumento que promove a conduta
irrazoável e irresponsável de provedores de serviços na internet. Isto porque, mesmo provedores de serviços que ajam
com negligência — ou até mesmo com malícia — na manutenção de conteúdo de cuja existência têm ciência, não po-
derão ser de qualquer forma responsabilizados, senão pelo descumprimento de ordem judicial extemporânea e, muitas
vezes, jurisdicionalmente distante”. THOMPSON, Marcelo.
Marco Civil ou demarcação de direitos?
Democracia,
razoabilidade e as fendas da Internet no Brasil. Revista de Direito Administrativo. Vol. 261, p.214 . Rio de Janeiro:
Fórum, set-dez. 2012.