

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 77, p. 25 - 38, Janeiro 2017
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A (Ir)Relevância da Defesa ou a
Arte de Falar para Ninguém
Antônio Carlos Pontes
Graduado em Direito pela UNESA e em Letras pela
UNIRIO. Professor da EMERJ.
1. A (Ir)Relevância das Manifestações Defensivas na
Apologia de Sócrates e Eichmann em Jerusalém
Sócrates teve um dia inteiro para se defender das imputações
de atentado contra a religião do Estado Ateniense e corrupção da ju-
ventude (perversão e subversão da mocidade, como querem alguns
tradutores), supostamente cometidas durante suas aulas da gradua-
ção em filosofia na Universidade de Atenas.
Parece muito tempo? Foi pouco. Seu destino foi a condenação
à pena capital. Mesmo sem arrependimento de como conduziu sua
autodefesa, o Pai da Filosofia não deixou passar despercebida a es-
cassez de tempo para expor toda a verdade sobre o caso: “Pois bem,
tivésseis esperado um pouco de tempo, a coisa seria resolvida por si:
vós vedes, de fato, a minha idade”
1
.
Apenas alguns jurados (275 de 556 juízes), na ocasião, acolhe-
ram sua tese absolutória, corroborando a célebre frase do filósofo:
“há mais coisas debaixo do Sol do que a nossa pobre razão pode
compreender”.
E quem há de dizer que Sócrates não era uma pessoa convin-
cente? Tivesse ele mais tempo (a par da covardia dos julgadores)
para desenvolver sua visão epistemológica da verdade sobre as im-
putações, talvez convencesse os julgadores de sua inocência. A par
da pena mortal, consagrou-se na imortalidade: o pai da filosofia. À
época do julgamento, todavia, não teve o justo reconhecimento: “vá
filosofia vã”.
1 PLATÃO.
Apologia de Sócrates
. Tradução: Maria Lacerda de Moura. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 2011, p. 51.