

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 62 - 71, out. - dez. 2016
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É nesse momento histórico que se estabelece o que Engels denomina de
família monogâmica. Esse modelo que triunfa na "civilização" nascente é
baseado no domínio do homem, com a finalidade expressa de procriação
e no qual a paternidade é uma exigência para que os filhos se tornem os
herdeiros de seus bens.
Entre os romanos, a palavra família originalmente sequer se apli-
cava a um casal e seus filhos, mas somente aos escravos.
Famulus
signi-
ficava escravo doméstico e família representava o conjunto dos escravos
pertencentes a um mesmo homem. Na visão de Engels também aqui a
origem de sua definição se confunde com o surgimento da proprieda-
de privada e com a necessidade de se ter controle sobre os bens e os
herdeiros. Dessa forma, “para assegurar a fidelidade da mulher e, por
conseguinte, a paternidade dos filhos, a mulher é entregue incondicio-
nalmente ao poder do homem. Mesmo que ele a mate, não faz mais do
que exercer um direito seu.” (p. 58). Vislumbra-se a formação de um
sistema patriarcal elaborado para garantir ao homem poder sobre os
seus bens mediante o controle sobre sua prole, que serão seus herdei-
ros. Primordial, portanto, manter o domínio sobre a mulher utilizando,
inclusive, de violência quando necessário.
LUGAR DA MULHER NA FAMÍLIA
A família moderna surge, então, como aquela que possui o homem
como chefe, cabendo a este o dever de zelar por seus bens, bem como
cuidar da transmissão destes aos seus herdeiros. Como a reprodução se
dá no corpo feminino, indispensável o controle desse corpo pelo homem.
Não há, sob essa ótica, lugar para uma visão romântica baseada no amor
e laços afetivos.
Rousseau (1995), em obra de 1762 que é considerada um marco di-
visório na história da educação -
Emílio ou Da Educação
- indica a posição
da mulher. Afirma que, em um casal, cada um concorre igualmente para o
objetivo comum, mas não da mesma maneira. Um deve ser ativo e forte,
o outro passivo e fraco. É preciso necessariamente que um queira e possa;
basta que o outro resista pouco. Estabelecido este princípio, afirma que a
mulher “foi feita especialmente para agradar o homem”, servindo de liga-
ção entre os filhos e o pai. A ela cabe fazer com que o pai os ame e lhe dê
confiança para chamá-los seus filhos (p. 497). É nítida a preocupação em
manter o controle sobre a mulher e a prole, como também aponta Engels.