

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 76, p. 132 - 156, out. - dez. 2016
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do ato político de ocupação coletiva. Tentativa de autoafirmação, autor-
reconhecimento e autoaceitação recíproca. A coletividade deve estimar
ocupações históricas e reconhecê-las como necessárias à formação de uma
sociedade justa e plural. A partir do reconhecimento social será possível ga-
rantirmos um novo tratamento jurídico e político para a questão fundiária.
Seguindo a linha defendida pelo autor da escola de Frankfurt, é
possível afirmar que os movimentos de luta pela terra têm fundamen-
to na política de identidade e na política tradicional de busca por bens
materiais. Tais demandas não são excludentes; segundo o autor, seguem
juntas, complementando uma a outra
34 e 35
.
De acordo com o autor, há uma hierarquia social a partir da estima
que se tem em cada grupo social, e a divisão de bens materiais está direta-
mente relacionada com esse grau de estimas. Desta forma, para que o tra-
tamento dado às demandas dos grupos ligados à luta pela terra tenha uma
repercussão diversa da que até o momento foi configurada, é imprescindí-
vel o reconhecimento por parte da sociedade da importância da demanda
social de tais grupos e do seu caráter extremamente transformador.
CONCLUSÃO
Diante da construção teórica realizada, nota-se a razão da existên-
cia de certas desigualdades no Brasil. A concentração da terra é fruto de
uma articulação realizada durante grande parte da história brasileira pela
elite latifundiária.
Desconstruir não apenas o ordenamento jurídico que garante a
concentração da propriedade, como também o senso comum da socieda-
de no que se refere à questão fundiária é tarefa difícil de ser cumprida, de-
vido aos inúmeros percalços impostos principalmente pelo Estado. O pró-
prio Poder Judiciário impõe diversos entraves, principalmente do ponto
de vista ideológico. O neutralismo no qual o juiz deveria fundamentar-se
só se observa no plano formal do processo, em seu mais puro ritualismo
36
.
34 HONNETH, Axel
in
SOUZA, Jessé e MATTOS, Patrícia (Organizadores).
Teoria Crítica do Século XXI
, ed. AnnaBlu-
me, p. 92. O autor, citando NANCY FRASER, afirma que “as regras que organizam a distribuição dos bens materiais
derivam do grau de estima social desfrutado pelos grupos sociais, de acordo com as hierarquias institucionalizadas
de valor ou uma ordem normativa”.
35
Ibid
. P. 87. Segundo o autor:
“Os conflitos sobre distribuição, contanto que eles não estejam meramente preo-
cupados apenas com a aplicação das regras institucionalizadas, são sempre lutas simbólicas pela legitimidade do
dispositivo sociocultural que determina o valor das atividades, atributos e contribuições. Desta forma, as próprias
lutas pela distribuição, ao contrário da hipótese de Nancy Fraser, estão travadas em uma luta por reconhecimento”.
36 MIGUEL BALDEZ,
Sobre o papel do Direito na sociedade capitalista – Ocupações Coletivas
: Direito Insurgente,
Ed. CDDH, 1989, Petropolis – RJ, p. 06 – Segundo o autor: “
O juiz pode ser neutro (nem sempre será assim) em face