

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 285 - 304, jul. - set. 2016
291
fazer nada”. Conscientemente ou não, contrariou a crença, especialmente
ativa na década de 1950, de que as mulheres deveriam gostar ou “na-
turalmente” gostariam da vida doméstica. Daí, numa escolha totalmente
funcionalista:
“Eu não pensava em estudar mais nada. Resolvi fazer Direito
porque meu tempo sobrava. Eu trabalhava das sete à uma.
Ía ficar em casa? Nada de saúde eu tinha o menor jeito. Achei
que queria estudar alguma coisa e que Direito era bom. E era
perto da minha casa.”
E foi assim que foi aprovada na Faculdade de Direito do Recife. Se-
gundo contou-me, lá não havia nenhuma professora, apenas professores
homens e o contingente de alunas devia ser de, no máximo, dez por cen-
to. Formou-se bacharel com 28 anos e aos 30 já ingressava na magistratu-
ra, no ano de 1966.
Muito embora soubesse que não havia juízas até então, diz que ins-
creveu-se no concurso “com a maior naturalidade” e afirma: “nem sabia
que só tinha eu. Fiquei sabendo lá no concurso”. Sua aprovação é, de fato,
completamente fora da linha normal. Tanto assim que passou 22 anos
como a única juíza do estado. Essa sua condição de exceção suscitou nos
outros várias elucubrações ao longo de sua carreira. Uma delas é de que
só teria sido aprovada por conta de seu nome dúbio. Inquirida sobre isso,
afirma que seria impossível, dado que o sexo do concorrente deveria estar
por escrito na prova. Além disso, as provas eram presenciais, então todas
as bancas a viram pessoalmente: “Havia prova escrita, prova prática - que
era dar uma sentença - e, por último, uma prova oral. Não há hipótese de
não saberem o sexo do candidato.”
Há ainda um outro “boato”, esse um pouco mais complexo de ser
desmentido, que também foi igualmente negado por ela. Trata-se da
história de que Magui só teria sido aprovada por ser sobrinha de Pedro
Martiniano Lins, desembargador que chegou mesmo a ser presidente do
TJPE, (não durante a época em que Magui fazia o concurso). Segundo ela,
isso não procede porque nunca chegaram a ter muito contato e, ao ser
perguntada sobre se ele teria, por exemplo, influenciado sua escolha pela
profissão, afirma categoricamente que não. Por outro lado, no seu dis-