

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 285 - 304, jul. - set. 2016
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Introdução
Ao escrever o presente artigo, me proponho a visibilizar um pouco
a história das mulheres na magistratura brasileira através da narração de
algumas vivências das primeiras sujeitas que “vestiram a toga” no Brasil.
Fato bastante recente em termos de tempo histórico, é preciso pontuar
que o país possui um sistema judiciário há mais de três séculos, com tribu-
nais, juízes e desembargadores desde 1609
2
e que a entrada de mulheres
na instituição só se iniciou nos últimos trinta anos
3
e, de maneira mais sis-
temática, só nos últimos vinte anos. Os impactos dessa entrada feminina
ainda estão sendo percebidos, haja vista ser esta uma área profissional ex-
tremamente antiga, clássica das profissões, de elevado prestígio social e
que durante mais de 300 anos existiu “muito bem” na completa ausência
feminina. Nesse sentido, pensar a feminização da magistratura represen
ta pensar um fenômeno recente e que pode significar a alteração de um
status quo
patriarcal.
A vontade de trazer as experiências dessas sujeitas a público surgiu
justamente quando tive necessidade de acessar dados históricos que con-
tassem as origens daquilo que se denomina de
processo de
feminização da
magistratura
, (JUNQUEIRA, 1999; BONELLI; 2010; CAMPOS; 2015) e me
deparei com o fato de que praticamente não há informações sistemáticas
e/ou acessíveis sobre as origens e o desenvolvimento desse processo.
Nos
sites
de diversos Tribunais de Justiça (TJ´s) do país, como o de
Pernambuco (TJPE), o do Rio Grande do Sul (TJRS) e o de São Paulo (TJSP),
quando acessamos as áreas específicas que tratam da história dos Tribu-
nais, absolutamente nenhuma menção é feita sobre quais mulheres te-
riam sido as primeiras juízas desses estados, sobre a história feminina na
instituição ou sobre quando e como este processo teria se iniciado. Da
mesma forma, nos principais
sites
de busca na
internet
, há pouquíssimas
informações precisas ou acessíveis sobre o tema, à exceção de alguns arti-
gos mais ou menos acadêmicos, que, mesmo assim, apresentam informa-
ções rareadas e complicadas de checar.
Essa pouca informação histórica, que implica numa
invisibilização
histórica
do processo de feminização da magistratura, provavelmente se
2 Quando se instituiu o Tribunal de Relação da Bahia, o primeiro do país.
3 Houve alguns casos de juízas que ingressaram há mais de trinta anos: Magui Azevedo, em Pernambuco, Tereza
Tang, em Santa Catarina e Auri Costa, no Ceará. Entretanto, cada uma delas passou mais de vinte anos sendo a única
mulher juíza de seus estados, então, talvez seja mais cabível considerá-las como exceções do que como gatilhos do
processo de feminização da magistratura (especialmente as duas últimas).