

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 268 - 284, jul. - set. 2016
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o combate à corrupção gera, como efeito colateral, restrições à coletivida-
de de credores, aos trabalhadores da companhia, à própria Administração
Pública como destinatária dos tributos e aos próprios consumidores (se
a recuperanda for concessionária de serviços públicos), sendo necessária
a meticulosa ponderação entre dano e benefícios para que se avalie a
validade da medida.
O critério específico, por seu turno, pode servir também para o ou-
tro lado. Por se estar no bojo de um processo de recuperação judicial,
pode-se entender a Lei nº 11.101/2005 como a mais específica ao pro-
blema concreto, sendo a Lei Anticorrupção mais genérica, e aplicável às
hipóteses não reguladas por legislação especial (como a recuperacional).
E, finalmente, completando este último argumento, vale trazer os
ensinamentos dos mestres Luiz Roberto Ayoub e Cássio Cavalli:
“O único meio de recuperação judicial arrolado no art. 50 da
LRF ao qual não se aplica a legislação extraconcursal consiste
na alienação ou arrendamento de unidade produtiva isolada
(inc. VII do art. 50 da LRF), em razão de o tema ser expressa-
mente disciplinado pela Lei 11.101/2005.”
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Seja qual for a alternativa a ser adotada, por certo, tanto a Lei nº
11.101/2005 como a Lei nº 12.846/2013 trazem enormes desafios que o
tempo e os tribunais superiores serão os responsáveis por darem a solu-
ção correta, mormente tratando-se de uma legislação pintada com tintas
jurídicas e econômicas que têm reflexos imediatos e importantes na eco-
nomia do país.
Enquanto não há resposta certa para o deslinde da questão, com
efeito, a indefinição sobre a possibilidade de sucessão de dívidas causa
instabilidade e inconsistência aos investidores e potenciais interessados
na aquisição dos bens da empresa em recuperação e/ou na reorganiza-
ção societária desta. Estes deixarão, afinal, de aportar recursos, diante
do magnânimo risco de se ver o produto sucessor da reorganização so-
cietária ser alcançado pelas iras da legislação anticorrupção.
Se o legislador não se preocupou em minimizar esse cenário de
incerteza, é dever dos operadores do direito implicados (o juízo recupe-
racional, o Ministério Público e as autoridades administrativas responsá-
11 AYOUB, Luiz Roberto; CAVALLI, Cássio.
A construção jurisprudencial da recuperação judicial de empresas
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Rio
de Janeiro: Forense, 2016, p. 231.