

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 193 - 206, jul. - set. 2016
201
por exemplo, o tecido jurídico, que de forma alguma deve colidir com a
natureza ontológica da Justiça – o que lamentavelmente ocorreu algumas
vezes ao longo da História.
A Justiça pertence antes de tudo à categoria de qualidade (formal),
mas possui papéis resolutivos que pertencem à categoria da quantidade
(funcional). A Justiça não pode esquivar-se do ponto de vista dos sujeitos
envolvidos, porque isso seria contrário à própria fonte primeira e última
da Justiça – o Bem. Aprofundar-nos-emos na Justiça, como anunciamos, à
medida que o conceito de Política for mais bem referenciado.
3. APROFUNDANDO O DIÁLOGO: AS 3 FUNÇÕES DA JUSTIÇA
A Política pertence à categoria da quantidade. Nela estão inseri-
dos os discursos e as diversidades, que são fatos concretos, mensuráveis,
centrífugos – quantificáveis; expressam-se por enunciados múltiplos e
plurais. A discursividade, o debate, o contraditório, a responsividade, he-
terogêneos exatamente em função desse atributo não acidental de suas
naturezas, constroem a própria Política em si mesma, mas não por si mes-
ma. Seu estatuto é o funcionamento (por isso afirmamos ser ela essencial-
mente funcional), o pragmatismo. Não estamos aqui falando em regimes
políticos específicos – como a democracia −, mas, sim, mostrando, em
consonância com a definição platônico-aristotélica de Política que apre-
sentamos há pouco, que a existência da pluralidade discursiva, do debate,
da controvérsia, da responsividade é intrínseca à Política.
A Justiça, por sua vez, é sintetizadora das pluralidades, e sensível
a elas, mas sua natureza é essencialmente (embora não exclusivamente)
abstrata (à maneira de uma língua em cotejo com os discursos que a com-
põem), imensurável, centrípeta – qualificável; a Justiça expressa-se por sen-
tenças. A Justiça ocorre em si mesma e por si mesma. Por essa razão é que
a qualidade, em que a Justiça se insere, é formal. Não se pode “convencer”
ou “persuadir” o “sujeito do deserto” a não ter sede, nem tampouco o “su-
jeito do mar aberto” a desejar beber um copo d´água. O estatuto último da
Justiça, pois, é o formalismo, o universalismo, o absoluto. Algo semelhante
àquilo que Goethe enunciou ao propalar que “a pureza é a força última do
Universo” (cf. GOETHE, 2004), ou que Kierkegaard nos apresentou ao sen-
tenciar: “O indispensável é o absoluto” (KIERKEGAARD, 1979).
Como ficou registrado, qualidade e quantidade, ao contrário do que
os extremistas poderiam sugerir, não são dicotomias, mas, sim, binômios: