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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 193 - 206, jul. - set. 2016

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1. INTRODUÇÃO

A palavra “arena” é de origem latina e forneceu, à língua portugue-

sa, tanto “arena”, sinônimo de “local de lutas” (de iguais ou desiguais),

quanto “areia”, que proveio da metonímia do fato de a areia ser o piso

com que se revestiam as arenas, e da metáfora de ser a mesma areia algo

essencialmente homogêneo e suave, facilmente passível de ser repartido

de modo igualitário e satisfatório. Com a areia também se faziam, desde a

Antiguidade, eficientes relógios. Portanto, a areia marcava tanto o territó-

rio (espaço), quanto a passagem das horas (tempo).

A partir dessa constatação etimológica, rumaremos à anamnese

das ideias centrais presentes nos conceitos de Justiça e de Política.

É necessário um preâmbulo. Para este ensaio, quando falamos em

“Política”, basta que se recorra de modo amplo à sua noção tão bem esta-

belecida, por exemplo, emPlatão e emAristóteles (cf. ARISTÓTELES, 2011).

Tanto naquele, o Professor, quanto neste último, seu Discípulo mais úbe-

re, o conceito de Política se delineia,

grosso modo

, como o conjunto de

sujeitos, individuais ou coletivos, que precisam conciliar seus interesses

específicos aos interesses de uma coletividade em que se inserem. As sub-

jetividades precisam adequar-se à objetividade do tecido coletivo/social.

É necessário que viver e conviver sejam conciliados, o que nem sempre

se dá de forma natural, uma vez que pode haver discordância de aptidões

e interesses – aliás, uma das regras da “condição humana” (cf. HANNAH

ARENDT, 2013). Duas ou mais pessoas convivendo requerem, obrigato-

riamente, o manejo da arte da Política. Isso ocorre indistintamente nas

culturas complexas (como as formadoras de civilização e/ou ciência) e nas

rudimentares. Todos nascemos em culturas, e estas põem sobre cada um,

ao nascer, suas marcas éticas e êmicas, que podem colidir com anseios e

interesses específicos.

Era a isso que Durkheim e Saussure (cf. SAUSSURE, 1984) se refe-

riam ao traçarem o conceito de “fato social”, em que a língua, entre ou-

tros fatos culturais, se insere: todo e qualquer fato social precede o nas-

cimento do indivíduo, e o indivíduo precisa adaptar-se à sua compleição,

mesmo que provisória; mudanças de compleição social, que são as regras

dos fatos sociais (contributo dos pós-estruturalistas às obras de Durkheim

e Saussure), sucedem os indivíduos e são geradas pela participação ativa

destes no tecido social em que atuam. Assim sendo, pessoas individuais,

com suas especificidades, inserem-se no convívio social; pessoas cole-