

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 9 - 30, jul. - set. 2016
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que aquele que o precedeu no século XIX, no qual a propriedade tinha um
significado fortemente econômico relacionado ao seu valor de uso ou troca.
Ela era instituto principal do direito privado e regulava todos os bens.
2-3
O doutrinador Fábio Konder Comparato
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alegava, sobre a proprie-
dade do século XIX, sua dupla natureza que recebia proteção constitucio-
nal, sendo de direito subjetivo e de instituto jurídico. No primeiro caso,
era protegida contra as expropriações impostas pelos Poderes Públicos,
garantia da liberdade individual. E no segundo, contra eventual tentativa
do próprio legislador de suprimi-la do sistema legal ou alterar seu conte-
údo essencial.
Foi com a II Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos
Humanos, realizada em Istambul em 1996
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, que se começou a discutir
sobre o conflito existente entre o direito tradicional de propriedade dos
locatários e o direito pessoal dos inquilinos à moradia própria e familiar,
que merecia proteção semelhante ao primeiro, daí a necessidade de cria-
ção de um direito autônomo para a habitação.
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Consolida-se então a ideia
de posse do séc. XXI, segundo a qual não basta apenas estar em contato
direto com a coisa; esse contato direto tem que buscar efetivar o princípio
da função social.
O direito à propriedade encontra-se enunciado dentro dos direi-
tos e garantias fundamentais, no artigo 5º, XXII, CRFB/88, devidamente
acompanhado da exigência ao cumprimento da função social no artigo 5º,
2 Como exemplo de sua importância, Rousseau no Discurso sobre a Economia Política afirmou que o fundamento
do pacto social é a propriedade, bem como de todos os direitos civis, não podendo subsistir nenhum outro no caso
de abolição da mesma.
3 Nesse sentido, ver: LARENZ, Karl.
in
MONTEIRO FILHO, Ralpho Waldo de Barros.
Função social, propriedade e as
modalidades sociais da usucapião;
RADBUCH, Gustav
in
MONTEIRO FILHO, Ralpho Waldo de Barros.
Função social,
propriedade e as modalidades sociais da usucapião
.
4 COMPARATO, Fábio Konder.
Direitos e deveres fundamentais em matéria de propriedade
. ”Embora tendo sido
declarada, no inicio do constitucionalismo moderno, direito fundamental da pessoa humana e garantia ‘inviolável e
sagrada’ da liberdade individual, sem a qual ‘não há Constituição’, a propriedade passou a ser estudada pela teoria
jurídica no século XIX, como um instituto de direito privado, estranho à matéria constitucional.”
5 Vide Declaração de Istambul sobre Assentamentos Humanos, art.15- “Esta conferência em Istambul marca uma
nova era de cooperação, uma era da cultura da solidariedade. À medida que entramos no século XXI, nos ofere-
cemos uma visão positiva dos assentamentos humanos sustentáveis, um senso de esperança para o nosso futuro
comum e um estimulo para enfrentarmos um desafio verdadeiramente válido e comprometedor, o de construirmos
juntos um mundo onde todos possam viver em uma casa segura, com a promessa de uma vida decente, com digni-
dade, boa saúde, segurança, felicidade e esperança.”; (
United Nations Conference on Human Settlements — Habitat
II
) realizada em Istambul. Turquia, entre 3 e 14 de junho de 1996.
6 RICCITELLI, ANTONIO.
Função Social da Propriedade
. “A II Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos
Humanos, realizada em Istambul em 1996, preconizou a necessidade de criação de um direito autônomo fundamen-
tal para a habitação, face ao conflito existente entre o direito tradicional de propriedade dos locatários e o direito
pessoal dos inquilinos à moradia própria e familiar que passou a gozar de proteção semelhante à daquele.”