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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 168 - 190, jan. - mar. 2016

assim, afirmar, como o tenho feito em pesquisas desde o ano de 1998,

que a discriminação da mulher é sempre um ato de violência

4

.

Até algumas décadas atrás, não eram produzidos dados estatísti-

cos sobre a vitimização feminina, nem no ambiente de trabalho e muito

menos relativos à prática de crimes contra a vida, a liberdade sexual e a

integridade física da mulher em situação de violência de gênero. Os nú-

meros eram invisíveis. Não se sabia quantas mulheres eram anualmen-

te vítimas de violência doméstica ou quantas morriam assassinadas por

homens com os quais mantiveram vínculos afetivos

5

. Hoje vários países,

Ongs, organismos regionais e internacionais se ocupam da produção de

tais dados.

Assim sendo, foi possível revelar que tais práticas são sistemáticas.

Ocorre, porém, que a mudança - no sentido da inclusão da mulher e tu-

tela de seus direitos-, se dá de forma dialética e paulatina, mas também

depende de fatores internos e externos que incidem sobre cada estado.

Assim mesmo, podemos afirmar que existem avanços

6

que convi-

vem com situações de possíveis “retrocessos”. Dois exemplos. Como ex-

plicar que o IBGE tenha identificado que entre 2004 e 2014 a dupla jor-

nada de trabalho feminina sofreu sensível avanço? Enquanto diminuiu a

jornada de trabalho masculina no lar, a jornada das mulheres aumentou.

Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) indica

que entre 2004 e 2014 as horas que elas dedicavam ao cuidado do lar

aumentaram em 54 minutos, passando de 4horas e 6 minutos em 2004

para 5 horas diárias em 2014! E curiosamente, as horas da jornada de

trabalho dos homens fora do lar diminuiu, mas isso não se converteu em

uma maior “colaboração” nas tarefas domésticas! Além disso, o ganho

salarial feminino caiu, se comparado com o ganho masculino

7

. Outra si-

4 Refiro-me à minha tese de máster, defendida em 1998, na faculdade de direito da Universidade do Saarland-

-Alemanha, na cidade de Saarbruecken e intitulada “A administração do direito das mulheres no marco do direito

internacional”, (monografia inédita).

5 O “modelo de protocolo latino-americano de investigación de las muertes violentas de mujeres por razones de ge-

néro (femicidio-feminicidio)", publicado pela ONU no ano de 2014 , no texto introdutório reconhece que a produção

de dados estatísticos sobre a violência perpetrada contra a mulher é muito recente (pág. IX). Acessível em: http://

www.ohchr.org/Documents/Issues/Women/WRGS/ProtocoloLatinoamericanoDeInvestigacion.pdf.

6 A título de exemplo, indico apenas um dado sobre o referido avanço: a proporção de mulheres no mercado de

trabalho no Brasil pulou de 57% em 1992 para 62.9% em 2004 e chegou a 64,8% em 2009. Ver: José Ribeiro Soares

Guimarães (org.). "Perfil do Trabalho decente no Brasil. Um olhar sobre as unidades da federação durante a segunda

metade da década de 2000". Brasília, OIT, 2012. Existe versão online disponível em:

http://www.oit.org.br/sites/

default/files/topic/gender/pub/indicadorestdnovo_880.pdf.

7 Os dados podem ser consultados no site do IBGE, em:

http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/pesquisas/pes-

quisa_resultados.php?id_pesquisa=149.