

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 140 - 167, jan. - mar. 2016
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espaço público que, em grande parte, é praticada por outro homem, a
mulher sofre mais com a violência ocorrida no espaço privado e os agres-
sores são (ou foram) namorados ou maridos/companheiros. Em 2013, dos
4.762 homicídios de mulheres registrados pelo SIM, 2.394, isso é, 50,3%
do total foram perpetrados por um familiar da vítima. Isso representa per-
to de sete feminicídios diários nesse ano, cujo autor foi um familiar. A
porcentagem relativa às mortes por parceiros e ex-parceiros é de 33,2%,
ou seja, 1.583 mortes. Neste caso, são quatro mulheres mortas por dia.
Sabemos que o Direito Penal não previne nenhum tipo de conduta
ilícita; exemplos há muitos, começando com a pena de morte ou a que di-
minui a idade de responsabilidade dos menores que delinquem, posto que
as estatísticas nos demonstram que não produzem o efeito de impedir a
comissão de delitos. Veja-se a situação do México, mais precisamente em
Cidade de Juarez. Apesar da condenação da Corte Interamericana de Direi-
tos Humanos no caso de Campo Algodonero, que ordenou ao Estado mexi-
cano uma série de medidas para contrarrestar a impactante perda de vidas
das mulheres dessa região, até o momento seguem ocorrendo assassinatos
de mulheres, sendo Cidade de Juarez a mais significativa (309 mulheres)
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.
Nesse último caso, devemos considerar as tendências do Direito
Penal Mínimo e os princípios constitucionais de não discriminação entre
homens e mulheres. Este princípio ver-se-á talvez afetado pela criação de
tipos penais especiais destinados a proteger a mulher vítima de violência;
contudo, uma correta interpretação não exige necessariamente mantê-
-los despenalizados. A função do Direito Penal Mínimo é de proteção, na
melhor forma possível, dos direitos de todos os setores sociais, procuran-
do fazer desaparecer as diferenças “jurídicas” entre eles. Por outra parte,
em benefício da postura de tipificação penal, a morte de mulheres nas
mãos de seus companheiros é uma das condutas que têm um maior
plus
de injusto frente aos delitos comuns, dada à especial vulnerabilidade de
suas vítimas.
Por outro lado, não podemos deixar os homicídios de mulheres
como um crime a mais no marco da violência social, pois corremos o pe-
rigo de banalizá-lo e dar passo a percepções tais como “foi crime pas-
sional”, como normalmente divulgam os meios de comunicação. Faz-se
necessário erradicar o termo “delito passional”, por ser um conceito mi-
26 Corte Interamericana de Direitos Humanos 10 de abril del 2009. Sentença do caso Campo Algodonero do
México.